Por Adilson Carvalho

Algumas combinações parecem funcionar tão bem nas telas que são temas recorrentes, principalmente quando bem explorados. Robert Zemeckis decidiu reviver o clima do clássico “Casablanca”, de Michael Curtiz vestindo Brad Pitt e Marion Coitillard com os arquétipos de uma história de amor e intriga em meio às incertezas da Segunda Guerra no filme Alliados (2016). Quando o filme estrelado por Humphrey Bogart e Ingrid Bergman foi lançado nos cinemas norte-americanos, os Estados Unidos já haviam entrado no conflito, tendo enviado assistência militar direta ao norte da África. Há várias histórias, no entanto, que o cinema contou tendo a Segunda Guerra como pano-de-fundo. Imitando a vida, a arte cinematográfica dramatizou um plano mirabolante para assassinar Adolph Hitler no auge de seu poder. Oficiais de alto escalão liderados pelo Conde Claus Von Stauffenberg discordando dos excessos do Fuhrer, decidiram dar um golpe de estado plantando uma bomba em seu QG. Na verdade, ao todo existiram 15 planos para matar Hitler e encerrar o sangrento Terceiro Reich. O plano de Stauffenberg foi entitulado “Operação Valquíria” e o resultado foi prematuramente anunciado pela rádio. Hitler se salvou, os conspirados foram executados e membros da resistência, bem como simpatizantes desta, igualmente mortos como retaliação. O filme de mesmo nome foi lançado em 2008 e trazia Tom Cruise como Stauffenberg. Em um dado momento do filme o Coronel Mertz (Christian Berkel) comenta sobre o uso de explosivos e diz “O truque é não estar por perto quando eles explodiram”. Esta mesma fala foi usada por David Niven em um clássico do gênero “Os Canhões de Navarone” (The Guns of Navarone) de 1961.

Este é uma adaptação do livro de Alistair MacLean, superficialmente baseado na Batalha de Leros, na Grécia. Nela, os alemães saíram vitoriosos contra os ingleses devido a sua superioridade aérea, e não haviam nenhuma artilharia de canhões. Esta foi a última grande vitória alemã, já que o território grego em questão continuou com os alemães até o final da guerra. No filme a fictícia ilha de Navarone, serve como base para uma avançados canhões nazistas que controlam o Mediterrâneo, importante acesso para as tropas de ambos os lados. O filme, dirigido por J.Lee Thompson, trazia uma força-tarefa enviada para destruir os canhões sob o comando do Capitão Keith Mallory, que no livro é inglês e no filme ganhou as feições americanas do astro Gregory Peck. O elenco ainda inclui os nomes de peso de David Niven (que no livro é ex- policial perito em explosivos e no filme tornou-se um ex professor de química) e Anthony Quinn (cujo nome foi usado para batizar uma Baía da ilha de Rodes, que foi usado como locação para as filmagens). Mais focado na ação direta do que em intrigas diplomáticas, o filme de Thompson é um dos mais renomados do gênero e, apesar de tiros, explosões e traições, foi interpretado pelo astro Gregory Peck como um filme não sobre guerra, mas sobre a necessidade de paz.

Reimaginar os eventos da segunda guerra foi o que fez o autor Jack Higgins (um dos vários pseudônimos do escritor britânico Harry Patterson). Inspirando-se na excelência dos paraquedistas alemães, Higgins escreveu “A Águia Pousou” (The Eagle Has Landed) sobre uma audaciosa e hipotética missão : Um pelotão de soldados nazistas se passa por soldados poloneses refugiados chegando a Norfolk, no norte da Inglaterra para capturar vivo ou morto o primeiro ministro Winston Churchill. A história é narrada do ponto de vista dos alemães liderados pelo Coronel Steiner seguindo as ordens do alto escalão alemão. O filme dirigido por John Sturges (É dele a direção do “Sete Homens & Um Destino” original e a adaptação do livro de Higgins foi seu último antes de se aposentar do cinema) chegou às telas um ano depois da publicação do livro. Muito importante na trama é a presença de Liam Devlin (Donald Pleasance), agente do IRA que toma parte da missão. Este vem a se tornar personagem recorrente em outros livros do mesmo autor, incluindo “A Águia Voou”, publicado em 1985, que dá sequência mostrando Devlin descobrindo que Steiner está vivo e parte em seu resgate. “A Àguia Pousou” serve de exemplo de como a segunda guerra continua a estimular a imaginação mesmo depois de tantos anos passados após a derrota dos nazistas.

Outra história hábil por mesclar fatos históricos e ficção foi “O Buraco da Agulha” (The Eye of the Needle) , escrito pelo autor britânico Ken Follet em 1978, vencedor do prêmio Edgar no ano seguinte, e adaptado para o cinema em 1981. Nele Donald Sutherland faz o papel de Heinrich Faber, codinome “Agulha” , um espião nazista infiltrado no Reino Unido que descobre tudo sobre o desembarque das tropas aliadas no chamado Dia – D. Foi em 6 de junho de 1944 que cerca de 155 mil soldados chegaram à costa da Normandia, na França, uma operação batizada de “Operação Overload”. Ken Follet imaginou como seria se um espião nazista tivesse posse desses planos e se desdobrasse para retornar para a Alemanha, sendo perseguido implacável mente pelos agentes ingleses. Ao se refugiar em uma ilha escosesa conhece uma bela mulher (Kate Nelligan) por quem se apaixona. Ainda assim, não permitirá que esse sentimento se interponha em sua missão. Na vida real, os alemães acreditaram que o local de desembarque dos aliados seria em Calais, ao norte da França e por esse erro estavam vulneráveis à invasão da Normandia.

Uma reimaginação curiosa do fato fez o filme “36 Horas” (36 Hours), de 1964. Nele, os alemães capturam o Major Jefferson Pike (James Garner) e o convencem de que ficara em coma durante muitos anos, tendo a guerra acabado. O objetivo é fazê-lo revelar tudo sobre a “Operação Overload”, mas o Major começa a desconfiar das aparências e planeja fugir. A história é bem criativa, mas que os roteiristas e os produtores não sabiam é que o escritor Road Dahl (autor de “A Fantástica Fábrica de Chocolate”) já havia escrito o conto “Beware of the dog” , que trazia essencialmente a mesma história. Coincidentalmente, o filme viria a ser oferecido a Dahl, para que este o roteirizasse. Patricia Neal, esposa de Dahl, descobriu a semelhança e por isso o estúdio da Metro precisou pagar Dahl pelos direitos. Curioso é que Patricia Neal foi convidada para o papel da enfermeira que se apaixona pelo Major Pike, mas recusou o convite e o papel ficou com Eve Marie Saint. Todas essas histórias revelam o quanto a Segunda Guerra continua a inflamar a imaginação de escritores, para os quais o conflito mundial ainda pode render uma boa diversão, mostrando que no amor, assim como na guerra, ou no campo da ficção – quando bem escrita claro – vale tudo.