CLÁSSICO REVISITADO: CLEOPATRA 60 ANOS

Por Adilson Carvalho

Aguarda-se para breve uma nova versão da história de Cleopatra, que será vivida por Gal Gadot (Mulher Maravilha). O papel já foi vivido por Claudette Colbert e Vivian Leigh, mas certamente que a versão de 1963 protagonizada por Elizabeth Taylor ganhou um lugar de destaque na história do cinema. Hoje 60 anos depois o impacto de sua produção megalomaníaca ainda persiste, bem como uma tumultuada história de bastidores envolvendo principalmente sua estrela, a fabulosa Elizabeth Taylor (1932/2011).

Roddy McDowell (à esquerda) e Rex Harrison (à direita)

Segundo os registros históricos, a rainha Cleopatra tinha o nariz mais pontudo e a pele bem mais morena que Elizabeth Taylor. Sua efígie está marcada em antigas moedas e estátuas vislumbradas em museus. Apesar de sua imagem está sempre associada ao estereótipo  de uma mulher extremamente sedutora, a rainha do Nilo era uma diplomata quando necessário e possuía habilidades intelectuais: Sabia falar mais de uma língua, possuía conhecimentos matemáticos e era astuta suficiente para sobreviver durante um longo tempo em um país dominado por Roma. Uniu-se em matrimônio aos 18 anos a Ptolomeu XIII, seu irmão de dez anos, já que na cultura egípcia não havia a conotação de incesto, pois assim a linhagem real estaria assegurada. Quando Roma invadiu seu país, segundo historiadores, enfiou-se em uma enorme sacola para papiros para chegar até o General Romano Julio Cesar, de quem se tornou amante e com quem teve um filho. Após a morte de Cesar, tornou-se amante de Marco Antônio, figura forte em Roma. Sua lendária morte, picada por uma serpente, já foi inclusive fonte de discussão entre estudiosos.

No início da década de 60, a 20th Century Fox, que vinha de uma série de insucessos buscava um projeto que a levasse  de volta ao topo e o escolhido foi a história da imperatriz egípcia que a princípio sería rodada com Joan Collins, Susan Hayward e Audrey Hepburn. Ao ser convidada para o icônico papel, Liz Taylor – na época casada com o cantor Eddie Fisher – teria respondido que “só faria se fosse por um milhão de dólares. A Fox aceitou fazendo de Liz a primeira atriz a ganhar tal soma, em um acordo que se apoiava no poder em cena da atriz, que ainda ganharia um percentual da bilheteria. Contudo, os problemas começaram a acontecer durante as filmagens (iniciadas em 1960) na Inglaterra  quando Liz contraiu forte pneumonia e teve inclusive que ser submetida a um a traqueotomia. O incidente causou um atraso gigantesco nas filmagens que foram transferidas para a Itália e todo o material rodado na Inglaterra foi jogado fora, assim como toda a cara cenografia teve que ser descartada. A direção que ficaria a cargo de Rueben Mamoulian (de A Marca do Zorro) ficou vazia quando este se desligou do projeto. Como o contrato de Liz Taylor lhe dava o poder de escolha e veto para a cadeira da direção, esta acabou ficando com Joseph L. Mankiewics com quem a estrela já havia trabalhado antes em De Repente no Último Verão (1959). A princípio, o diretor queria fazer dois filmes com três horas de duração cada e que se chamariam Cesar & Cleópatra e Anthony & Cleópatra, mas os gastos cada vez maiores (fontes indicam que passou dos US$ 40 milhões) levaram a Fox a pressionar Mankiewics para montar um único filme, o que levou ao corte de 90 a 120 minutos de cenas rodadas.

Outra mudança inicial foi o papel de Julio César, que seria de Peter Finch, mas o atraso nas filmagens o levou a se desligar do papel que acabou com o ator inglês Rex Harrison. Este, ao assinar o contrato exigiu que seu rosto aparecesse nos cartazes promocionais do filme junto ao de Liz e Richard Burton, o ator que interpreta Marco Antônio – papel vivido por Marlon Brando em Julio Cesar de 1953 e que chegou a ser sondado para reprisar o papel em Cleopatra (1963). Stephen Boyd (o Messala de Ben Hur) também chegou a acertar como Marco Antônio mas também abandonou o papel devido ao atraso para as filmagens. Uma das maiores injustiças na história do Oscar foi cometida com Roddy McDowall que interpreta Otaviano em Cleópatra. Quando a Fox encaminhou o nome de McDowall para a Academia para a qual deveria de ser indicado como melhor ator coadjuvante, cometeu o equívoco de registrar a indicação apenas como melhor ator. Apesar de tentar retificar o fato, já havia passado o prazo necessário e a Academia negou a McDowell sua indicação que contava com o favoritismo. Tantos incidentes ainda foram poucos. Algumas atrizes que trabalhavam como escravas e servas de Cleópatra fizeram greve de alguns dias para conseguir guarda-costas pois vários italianos, entre os extras, as beliscavam.  Os cenários, todos os 79 eram grandiosos e demoraram a ser construídos como o Fórum de Roma, construído nos estúdios de Cinecittá, cujo tamanho era três vezes mais que o original. Contudo, um dos fatores que mais atraiu publicidade foi o caso de amor entre Elizabeth Taylor e Richard Burton que alimentava os tabloides da época. Liz e Richard ainda eram casados e o escândalo foi tão grande que até o Vaticano se pronunciou condenando os atores. Liz & Richard assumiram o romance, separaram de seus respectivos conjugues e se casaram, vivendo uma relação de idas e vindas, de amor e ódio, ao longo de 11 filmes e 10 anos de casamento. Um ano depois de se separarem, o casal reatou e voltaram a se casar ficando por mais um ano ao fim do qual voltaram a se separar. Essa relação turbulenta e apaixonada gerou o filme para Tv Liz & Dick (2012) com Lindsay Lohan (outra cuja vida vive nos tabloides) como Elizabeth Taylor.

Mankiewics dirige Elizabeth Taylor

O que aconteceu com Cleópatra foi resultado de egos inflados e decisões equivocadas dos chefões da Fox. Orçamentos milionários diversas vezes não garantiram o sucesso de um filme. O ritmo arrastado em uma montagem que supervaloriza os diálogos e o efeito “Liz em cena” não foram o suficiente para um bom resultado nas bilheterias em um filme que não soube equilibrar os superlativos da produção com a narrativa. O filme quase levou à falência da Fox só pagando seu alto custo depois de contabilizada a bilheteria internacional e a venda do filme para exibição na TV.  Revisto à luz da atualidade, seu custo que hoje atualizado seria de US$ 330 milhões gastos em cenários grandiosos, salários altos (além de Liz ter ganho um milhão, o diretor – que quase abandonou o projeto – teria recebido 4 milhões) e luxuoso figurino: Foram criados 26.000 peças de vestuário, sendo que Liz troca de roupa 65 vezes (um recorde para a época) ao custo de US$ 194.800 incluindo uma vestimenta feita de ouro de 24 quilates. A aura mítica do filme, contudo, o torna uma agradável reprise, já lançado em blu Ray nos Estados Unidos mas não no Brasil, e que nos leva de volta a uma Hollywood que apesar de mitológica, mágica e sedutora, nunca deixou também de ser turbulenta, polêmica e cercada de intrigas de bastidores, sendo talvez até por isso mesmo deliciosa de ser reavaliada.              

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