PRELO & PELÍCULA : OS TRÊS MOSQUETEIROS

Por Adilson Carvalho

Há 221 anos nasceu Alexandre Dumas, um dos maiores autores dos romances históricos. Vamos lembrar das adaptações de Os Tres Mosqueteiros para o cinema.

O clássico brado “Um por todos e todos por um“, inventado pelo autor Alexandre Dumas (pai) entrou para o imaginário popular como símbolo de amizade e lealdade na história de tres herois que na verdade são quatro, já que a história gira em torno do amadurecimento de D’Artagnan, gascão ingênuo e impetuoso que sonha em se tornar membro da guarda de elite do Rei Luis XIII da França, um verdadeiro épico, e um dos maiores romances históricos de todos os tempos. A trajetória de D’Artagnan, Athos, Porthos e Aramis é um dos épicos mais adaptado da história do cinema e uma das obras primas da literatura mundial. Em 30 de novembro de 2002, o presidente francês Jacques Chirac mandou que os restos mortais de Alexandre Dumas fossem transferidos para o mesmo cemitério onde foram sepultados outros grandes filósofos e escritores da França como Victor Hugo e Voltaire. Houve uma procissão com um  caixão carregado por quatro homens vestidos como se fossem os mosqueteiros  e Chirac discursou “Contigo, nós fomos D’Artagnan, Monte Cristo ou Balsamo, cavalgando pelas estradas da França, percorrendo campos de batalha, visitando palácios e castelos — contigo, nós sonhamos”. Uma homenagem que demonstra a força da narrativa de Dumas.

Douglas Fairbanks no filme de 1921

NAS PÁGINAS DE DUMAS. É importante diferenciar, porém Alexandre Dumas pai (1802-1870) do seu filho homônimo Alexandre Dumas filho (1824-1895), que era fervoroso católico e  é basicamente famoso por ter escrito A Dama das Camélias (Camille) várias vezes filmado e inspirado em uma prostituta/cortesã que realmente conheceu. Já o pai era neto de uma escrava negra do Haiti e filho de um General de Napoleão. Entre outras obras suas famosas estão A Rainha Margot, A Tulipa Negra, Os Irmãos Corsos e outros (O IMDB registra 247 adaptações para cinema ou TV de obras suas). D’Artagnan originalmente encarnava a figura do herói clássico romântico que através do sacrifício e da dor procura servir a um bem maior. Não só D’Artagnan  como também Athos, Porthos e Aramis realmente existiram, embora não haja qualquer registro histórico de que seus feitos tivessem seguido o mesmo curso traçado por Dumas em seu romance. Também o Rei Luis XIII, a Rainha Ana da Áustria, o Duque de Buckingham e o malévolo Cardeal Richelieu também foram pessoas reais que viveram cerca de 200 anos antes da época de Dumas. A história registra fatos como a rivalidade entre França e Inglaterra, o caso amoroso entre Ana da Áustria e o Duque de Buckingham,  os conflitos do reinado de Luis XIII com os Huguenotes (Protestantes Franceses) e o cerco à cidade de La Rochelle (reduto dos Huguenotes). Dumas pesquisou livros e documentos na biblioteca de Paris para servir de base para seu romance, mas fez uso de sua incrível imaginação para reinventar tudo, e de tal forma que é praticamente impossível separar o que é fato do que é ficção. O que Dumas fez dividiu muitas opiniões em 1844 – ano em que começou a publicar como folhetim Os Três Mosqueteiros nas páginas do jornal francês Le Siècle. Seus detratores o acusavam de adulterar a história, mas isso não impediu que se tornasse um grande triunfo comercial e artístico, tanto que no mesmo ano a obra foi reeditada na forma de livro. Também no mesmo ano, Dumas publicou outro clássico do gênero: O Conde de Monte Cristo. Não muito tempo depois, Dumas deu sequência à história dos mosqueteiros em dois livros: Vinte Anos Depois (1845) e O Visconde de Brangelonne (1848), sendo este último a fonte do clássico O Homem da Máscara de Ferro. Curioso é que o nome “mosqueteiro”  deriva de um mosquetão –  um tipo de espingarda de longo alcance – e não da rapieira – aquela espada fina e comprida sempre automaticamente associada aos heróis do gênero capa e espada.

Lana Turner como Milady e Gene Kelly como D’Artagnan

AS PRIMEIRAS VERSÕES. A primeira adaptação de Os Três Mosqueteiros para o cinema, sempre segundo o IMDB, foi realizada em 1911, num curta estrelado por Sidney Booth (mas até antes disso ainda em 1898, houve outro curta mostrando o Concurso de um Duelo de floretes baseado no filme). Em 1912 teve um francês com Emile Dehelly, mas o mais famoso seria com Douglas Fairbanks (pai) –  então o maior astro do gênero – no papel de D’Artagnan (1921, filme disponível em DVD nos EUA). E também na comédia a versão de Max  Linder, notável humorista francês que influenciou Chaplin, como o Mosqueteiro. E o que dizer do famoso desenho com Tom e Jerry de Mosqueteiros!?!. A primeira versão do cinema falado, surge já em 1932, na França com o hoje esquecido Aimé-Simon Girard. Em 33 inspira aventura com John Wayne passada no Deserto (Wayne estrelaria western C vagamente lembrando Dumas), e outro filme na França em 34, com elenco ainda menos conhecido. Em 1935, os americanos fazem o primeiro filme grande sobre o tema, dirigido pelo especialista Rowland V. Lee com Walter Abel, Paul Lukas, Margot Grahame. E em 1939, Don Ameche faz D’Artagnan numa farsa paródia dos Mosqueteiros (que são os comediantes Irmãos Ritz). Em 42, o mexicano Cantinflas também faz sua versão, seguida pela argentina de 45, com Armando Bo.

Os Mosqueteiros de Richard Lester

MOSQUETEIROS NAS TELAS. A melhor versão, sem  dúvida , veio em 1948, na Metro, com direção do especialista me musicais, George Sidney, que fazia brilhante uso do Technicolor e todos os duelos eram coreografados como se fossem danças, especialmente para os talentos de Gene Kelly como D’Artagnan. O roteiro de Robert Ardrey seria base para as futuras adaptações condensando várias passagens do livro se concentrando na armadilha arquitetada pelo Cardeal Richelieu para expor o caso amoroso da rainha Ana da Áustria com o duque de Buckingham.  Para isso, o vilão (Vincent Price) conta com a ajuda da pérfida Milady de Winter, ex-mulher de Athos ( Lana Turner, grande estrela da Metro em seu melhor momento). O filme traz um elenco excepcional, que inclui June Allyson,Van Heflin, Angela Lansbury –como a rainha-, Gig Young, Frank Morgan. A supervisão das lutas coube ao mestre belga Jean Heremans, que no transcorrer do filme aparece interpretando vários adversários de D’Artagnan. Em 1950, teríamos o nosso Mosqueteiro numa hoje esquecida comédia com Colé, Celeste Aida, em Todos por Um, de Cajado Filho. Na França em 53, Georges Marchal e Yvonne Sanson lideram outros Mosqueteiros, em 54 viram série da TV americana (ao vivo), imitada depois na Europa em 56 (que inspiraria adaptação para o cinema no ano seguinte). De importante depois teve em 1961, em duas partes, a versão francesa do especialista Bernard Borderie (fez depois Angelica, Marquesa dos Anjos) com Mylène Demongeot de Milady e Gérard Barray). Em 1967, os ingleses fizeram uma versão para a teve com Jeremy  Brett, Brian Blessed, que teve duas temporadas, a segunda com Joss Ackland como D’Artagnan).

A versão pop dos anos 90

DÉCADAS DE ADAPTAÇÕES. Dentre outras adaptações menores, finalmente surgiu em 1973, uma superprodução dos irmãos Ilya e Alexander Salkind, (os mesmos do Superman em 1978.). Reuniram um ótimo elenco, mas os produtores eram famosos  por serem desonestos e fizeram dois filmes pelo preço de um (mentindo para o elenco que teve que processá- los). Exibido aqui pela Condor Filme, o filme adotou um tom de comédia, ou quase, graça a direção criativa de Richard Lester (famoso pelos filmes dos Beatles, e que estavam no auge da carreira). O ator inglês Michael York era D’Artagnan e o trio de mosqueteiros foi formado por  Oliver Reed (Athos), Frank Finley (Porthos) e Richard Chamberlain (Aramis). O elenco incluía ainda Charlton Heston como Richelieu, Christopher Lee (o eterno Drácula) como o Conde Rochefort, Geraldine Chaplin como a Rainha e Faye Dunaway como Milady. É lembrado também por trazer a melhor interpretação da carreira de Raquel Welch, que faz uma atrapalhada Constance vivida por Raquel Welch. Ainda registram-se versões na França nos anos 70 com o grupo Les Charlots, um desenho animado e curiosamente também um filme chamado O Quinto Mosqueteiro (The Fifth Musketeer, 77, de Ken Annakin, com Sylvia Kristel (Emmanuelle), Ursula Andress, Cornel Wilde, Beau Bridges, Ian McShane, Olivia de Havilland, Rex Harrison). Mas apesar de ter os três mosqueteiros é mais próxima de O Homem da Máscara de Ferro. O filme nunca passou em nossos cinemas! Outra curiosidade: em 1952, Cornel Wilde fez o papel de D´artagnan Jr no filme Os Filhos dos Mosqueteiros (At Sword´s Point), de Lewis Allen, com Maureen O´Hara, com a filha de Athos, Dan O´herlihy era Aramis Jr e Alan  Hale Jr filho de Porthos (no caso a piada era que o pai dele interpretou o papel de Porthos em O Homem da Máscara de Ferro (34). Lester voltou a fazer mais um filme sobre os mosqueteiros em 89 reunindo o elenco do filme anterior, filme que não chegou aos nossos cinemas. Em 1993 a Disney resolveu produzir a mais pop das adaptações do texto de Dumas com direito a trilha-sonora com os astros da música Brian Addams, Rod Stewart e Sting. No elenco, Chris O’Donnell, então com 23 anos, ficou como D’Artagnan que no livro de Dumas não tem mais de 19 anos. Seus companheiros de armas foram Kiefer Sutherland, Oliver Platt (Porthos)  e Charlie Sheen como o religioso (ex-padre) Aramis. Esta versão noventista parecia Os Jovens Pistoleiros no estilo de uma aventura de capa e espada. Mesmo encenado com atores com idades mais próximas de seus personagens, o filme utilizou muito pouco do texto original

Mosqueteiros em 3D

AS MAIS RECENTES. Ainda tivemos A Filha de D’Artagnan, produção francesa de 1994 em que Sophie Marceau interpreta a suposta herdeira do lendário herói porque foi dirigida pelo importante de Bertrand Tavernier (Philippe Noiret era seu pai mas o filme não credita Dumas). Na Inglaterra, em 2001, teve Young  Blades, com Hugh Dancy, e os americanos tentaram de novo com A Vingança do Mosqueteiro (The Musketeer) em 2001 tentando lançar como astro o pequeno e atlético (o forte do filme eram as cenas de artes marciais!) Justin Chambers, que depois fez Grey´s Anatomy, no papel de D´Artagnan. Catherine Deneuve era a Rainha, Peter Hyams o diretor e Stephen Rea o Richelieu. Um total fracasso. Depois houve um musical holandês dos Mosqueteiros em 2003, o telefilme francês Milady com Arielle Dosmbale em 2004 e outra produção francesa mais Classe A chamada D´Artagnan et les Trois Mousquetaires, de 2005 com Emmanuelle Béart, de Milady e Vincent Elbaz de D´Artagnan. Em 2010 uma coprodução Anglo-Alemanha feita pelo diretor americano Paul W.S.Anderson, transformou a história de Alexandre Dumas em um espetáculo 3D e um veículo para sua mulher, a estrela Milla Jovovich como Milady. Entre 2014 e 2016 houve a série Os Mosqueteiros, produzida e distruída pela BBC America e BBC Worldwide estrelado por Luke Pasqualino, Tom Burke, Santiago Cabrera e Howard Charles como o quarteto de mosqueteiros D’Artagnan, Athos, Aramis e Porthos, respectivamente, além de Peter Capaldi (Dr. Who) como Richelieu. Foram 3 temporadas e um total de 30 episódios com a qualidade da BBC. Com tantas versões, esperamos que o espírito de Dumas seja eterno para os amantes da aventura.

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