CLÁSSICO REVISITADO: CHAPLIN (1992)

Por Mauricio Rocha

kinopoisk.ru

Quando comecei a escrever sobre cinema, percebi que alguns artistas, tem uma vida mais interessante do que seus filmes. Não que sua obra fique em segundo plano, ou que seja algo maçante, pelo contrário, no caso, quando se fala de um dos maiores nomes de todos os tempos da sétima arte, como é no caso de Charles Chaplin, muitas pessoas não conhecem a sua obra, mas, suas polemicas. E como minha proposta é escrever sobre filmes, artistas e sobretudo, contar histórias através de resenhas, hoje, quero escrever sobre a cinebiografia daquele artista do cinema que eu mais tenho carinho. Sim, estou falando sobre o nosso querido e eterno Carlitos.

The Little Tramp, ou, Carlitos, como conhecemos aqui no Brasil. Não só seu personagem mais famoso, mas, um dos mais famosos de todos os tempos. Simplesmente, icônico.

No natal de 1977 o mundo foi pego de surpresa com a notícia da morte de Charles Chaplin. O artista morreu aos 88 anos na sua casa na Suíça ao lado da esposa Oona, de seus filhos e netos. Chaplin é tido por muitos como um dos nomes mais importantes da sétima arte. Quinze anos após a sua morte, foi lançado o filme “Chaplin” que conta a sua história. O filme foi dirigido por Richard Attenborough, ganhador do Oscar por “Gandhi”. E quem interpretou Charles Chaplin no filme, foi Robert Downey Jr, hoje, um dos atores mais queridos e famosos do mundo por conta do Homem de Ferro do MCU. Como dito anteriormente, eu quero falar sobre a cinebiografia deste artista tão fabuloso que em dezembro passado, completaram 45 anos de sua morte, comemora 30 anos de lançamento de sua cinebiografia.

Charles Chaplin, em 1923, há exatos 100 anos.

Falar sobre o Charles Chaplin para mim, é como falar de um grande amigo. Afinal, Carlitos é amigo do público. Mas, para quem não sabe, eu mesmo interpretei o Carlitos em alguns curtas metragens e até fui premiado por alguns deles. Tudo em homenagem a este gênio. Mas, hoje quero me dedicar a falar sobre a cinebiografia Chaplin. E falar sobre o filme, é importante falar um pouco sobre o próprio Charles Chaplin.

Charles Spencer Chaplin, nasceu em 16 de abril de 1889 na Inglaterra. Os pais dele, Hannah e Charles tinham um filho antes do nosso Carlitos nascer. Aliás, o filho era só de Hannah, mas, isso é uma longa história. Quando tinha 5 anos de idade, estreou nos palcos ao substituir a sua mãe, Hannah que havia tido uma crise. A partir daí, surge o artista. Nos anos seguintes, Charles fez alguns trabalhos como ator e dançarino, fez parte dos Oito Rapazes de Lancashire e até participou de uma peça com William Gillete de Sherlock Holmes. Mas, a vida pessoal do pequeno e jovem Charles era quase que caótica. O pai morreu quando ele tinha 12 anos vitima de cirrose e aos 14, viu sua mãe enlouquecer e teve que interna-la em um sanatório. Se não fosse seu irmão Sydney, talvez, jamais teríamos conhecido Charles Chaplin. Foi Sydney que apresentou Charles à Fred Karno, famoso empresário de teatro na virada do século XIX para o século XX. Na companhia de Karno, Charles participou de alguns espetáculos e se recebeu inúmeros elogios por interpretar um bêbado na peça Mumming Birds. Até aí, Charles era só um artista de teatro, até que Mack Sennett, um dos pioneiros da comédia o viu no palco e o contratou em 1913 para sua produtora a Keystone. Em 1914, Charles fez seu primeiro filme, Carlitos repórter. Mas, não era o Carlitos. No filme seguinte, ele interpretou aquele que é seu personagem mais famoso, senão, o mais famoso da história do cinema, o Vagabundo Carlitos. Depois disso, o resto é história. Ele fez 83 filmes ao longo de sua carreira que durou mais de meio século. Casou-se quatro vezes e teve um total de onze filhos.

Agora que vocês conhecem a história do Chaplin, mesmo de maneira resumida, vamos para o filme Chaplin.

Charles Chaplin no Bafta de 1976, junto da Princesa Margareth, Richard Attenborough (diretor do filme) e sua esposa, Oona O’Neil.

Richard Attenborough e Ben Kingsley, ganhadores do Oscar em 1983 por Gandhi, respectivamente, Melhor Diretor/Melhor filme e Melhor Ator

Em 1983, Richard Attenborough foi agraciado com o Oscar de Melhor diretor e melhor filme por Gandhi. Após isso, o nome dele estava em alta em Hollywood. Ele dirigiu alguns outros filmes ainda nos anos 80 como Um grito de Liberdade e Chorus Line, mas, faltava algo a ele. Algum grande desafio, talvez, do tamanho de Gandhi. Foi quando a produtora Diana Hawkins sugeriu ao Attenborough: “Já que você é muito fã de um certo alguém, por que não fazer um filme sobre Charles Chaplin?” Attenborough gostou da ideia, afinal, ele era fã de Charles Chaplin desde que ele assistiu Em Busca do Ouro quando era criança. Attenborough falou com a viúva de Chaplin que era muito amigo e ela aprovou o filme lhe dando liberdade total para fazer o que bem entendesse com o filme, claro, sendo fiel ao Chaplin.

O problema era: por onde começar? Chaplin teve uma vida muito vasta. Viveu 88 anos e um filme de duas horas ou três horas não era capaz de preencher todo esse período. Attenborough e o roteirista Bryan Forbes se apegaram a duas obras literárias sobre Chaplin, a sua própria autobiografia de 1964 e a biografia de David Robinson, Chaplin – Sua vida e sua arte, conhecida aqui no Brasil como Chaplin – uma biografia definitiva. Bryan forbes então escreveu uma versão do roteiro mais focada em elementos mais pesados da vida do Chaplin, mas, o roteiro foi descartado. Após isso, William Goldman, William Boyd e Diana Hawkins finalizaram o roteiro. Mesmo com o roteiro de Bryan Forbes tendo sido descartado, parte dele foi utilizada na versão final.

Robert Downey Jr. e Geraldine Chaplin, no filme, a filha de Charles Chaplin interpreta sua própria avó

Finalizado o roteiro, o próximo passo foi o elenco. Logo, o elenco foi selecionado e aí vem uma série de curiosidades. Antes de Dan Aykoroyd e Mila Jovovich serem definidos como Mack Sennett e a primeira esposa de Chaplin, Mildred Harris, John Goodman e Winona Rider foram as primeiras escolhas para os papéis. O eterno 007, Pierce Brosnan, quase interpretou Douglas Fairbanks, um dos grandes astros do cinema mudo e o melhor amigo que Chaplin teve em Hollywood. Mas, o grande problema estava para chegar. Quem deveria interpretar Charles Chaplin?

Quando Attenborough apresentou o projeto para a Universal Studios no final dos anos 80, havia alguns atores seriamente cotados para interpretar o gênio da sétima arte. E atores de peso mesmo: Al Pacino, Robert De Niro, Dustin Hoffman, Billy Cristal, Robin Williams, Tim Curry, Tom Hanks, John Cusack, Jeff Brigdes, Nicolas Cage, Tom Cruise, Johnny Depp e até Nick Nolte. Até aí, nada de Robert Downey Jr. Até que o Downey Jr foi falar pessoalmente com Attenborough que ficou impressionado com a semelhança do ator com Chaplin.

Quando Attenborough disse que queria escalar Downey Jr como Chaplin em seu filme, os executivos da Universal ficaram irritados, afinal, eles queriam ver Dustin Hoffman, Billy Cristal ou algum ator de renome interpretar Chaplin e não um novato mais conhecido por comédias juvenis dos anos 80. O problema é que os atores que os executivos já eram bem considerados por Attenborough bem velhos e o que fazia com que Downey se destacasse, era sua idade, ele tinha apenas 25 anos na época. Após algumas discordâncias, a Universal se retirou do projeto, até que Mario Kassar se interessou e produziu o filme bancando em 31 milhões de dólares o orçamento.

Quanto ao Robert Downey Jr como Chaplin, ele se dedicou demais ao personagem. Aprendeu a tocar violino e jogar tênis com a mão esquerda porque Chaplin era canhoto. Estudou todos os maneirismos do personagem de Chaplin junto de Dan Kamin, um dos grandes nomes da pantomima nos estados unidos. Aprendeu o sotaque britânico de Chaplin. E no fim das contas, foi indicado ao Globo de Ouro e ao Oscar de Melhor Ator de 1993 e acabou perdendo para Al Pacino por Perfume de Mulher.  Mas, ganhou o Bafta de melhor ator.

O elenco do filme tem nomes de peso, além do já citado Robert Downey Jr, tem, Anthony Hopkins como George Hayden editor que conversa com o velho Chaplin no decorrer do filme, Geraldine Chaplin interpreta sua própria avó Hannah, Paul Rhys interpreta Sydney, irmão de Charles Chaplin, Moira Kelly interpreta duas personagens no filme, a primeira grande paixão de Chaplin, Hetty Kelly e a ultima esposa dele, Oona, Kevin Kline interpreta Douglas Fairbanks amigo e confidente de Chaplin, Dan Aykroyd interpreta Mack Sennett, o produtor que o contrata para fazer filmes. Mila Jovovich interpreta Mildred Harris, Marisa Tomei interpreta Mabel Normand, atriz dos primeiros filme de Chaplin, Penelope Ann Miller interpreta Edna Purviance, principal atriz dos filme de Chaplin, Diane Lane interpreta a atriz e esposa de Chaplin, Paulette Goddard, Nancy Travis interpreta Joan Barry que foi uma namorada de Chaplin nos anos 40 e lhe causou inúmeros problemas judiciais, Kevin Dunn interpreta J Edgar Hoover, chefão do FBI e James Woods interpreta Joseph Scott, advogado de defesa de Joan Barry.

A trilha sonora, profundamente emocional e melancólica é composta por John Barry e foi indicada ao Oscar e a fotografia é de Sven Nykvist, famoso por suas parcerias com Ingmar Bergman, não é um dos destaques do filme e fica longe de ser um de seus melhores trabalhos. A direção de arte e decoração de set do Stuart Craig e do Chris Buttler é um ponto positivo do filme, bem fiel ao período que se passa e foram indicados ao Oscar.

Por fim, na minha opinião, Chaplin é uma biografia tímida sobre um dos grandes nomes da sétima arte. Alguns problemas no roteiro, preferiram cobrir de maneira corriqueira e focar mais nas polemicas do que de fato na vida e na obra de Chaplin e nisso, não se preocuparam com alguns fatos importantes da vida de Chaplin, como a gravidez de Mildred Harris, onde, o primeiro filho de Chaplin nasceu prematuro com complicações e morreu três dias depois e foi esta tragédia na vida de Chaplin que lhe rendeu a concepção de um de seus melhores filmes, O garoto. Como também, a pouquíssima ênfase que dão à Edna Purviance que foi muito importante para Chaplin tanto em sua vida profissional como na sua vida pessoal. Enfim, Chaplin é um bom filme para conhecer um pouco da vida de Chaplin, mas, eu indico à quem leu este artigo, que leia uma das biografias de Chaplin.

Ao menos, é uma obra feita em respeito ao artista e ao homem Charles Chaplin.

Em breve, farei um especial sobre Charles Chaplin aqui no Cinema com Poesia.

(Mauricio Rocha, ator, diretor, roteirista poeta e escritor)

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