Por Adilson Carvalho

Você que está sendo essa matéria talvez não saiba mas há 92 anos nasceu em Paris dos maiores diretores da história do cinema do século XX, François Truffart (1932 – 1984). Foi um dos fundadores do movimento cinematográfico conhecido como Nouvelle Vague e ao longo de quase 25 anos de carreira dirigiu 26 filmes, conseguindo conciliar um grande sucesso de público e de crítica na maior parte deles. Antes de tudo, sempre foi um apaixonado cinéfilo, admirador dos trabalhos de Howard Hawks (1896-1977) e Alfred Hitchcock (1899-1980), e que faltava às aulas para ir ao cinema. Assim fundou aos 15 anos um cineclube, chamado Cercle cinémane. Aquela era uma época de enorme efervescência cultural na França do pós-Segunda Guerra Mundial, e os cineclubes, lotados, eram o local para se assistir às projeções e discuti-las depois. Mas o Cercle não teria vida longa, já que ele concorria com o Travail et culture, cineclube do escritor e crítico de cinema André Bazin. Quando este soube que o Cercle estava à beira da falência, foi conhecer o jovem Truffaut e, sensibilizado com o menino cinéfilo, passou a ser uma espécie de mentor para François. Dessa forma, Truffart veio a se tornar um jovem crítico de cinema apadrinhado por André Bazin, o editor da revista “Cahiers du Cinéma”. Foi nesse contexto que nasceu um grupo, que decidiu fazer um cinema autoral, criando assim a Nouvelle Vague, filmando nas ruas, muitas vezes com som direto. Os nomes de Truffart e Jean Luc Goddard foram os maiores expoentes desta nova onda.

Autoral, intimista e com baixo custo, os cineastas da Nouvelle Vague recriaram a forma de fazer filmes. Seu primeiro filme, o curta-metragem Uma Visita, filmado em preto-e-branco e 16mm, feito em 1954, mesmo ano em que escreveu a história de Acossado, que viria a ser dirigido por Jean Luc-Godard (1930-2022), e com quem co dirigiria Une Histoire D’Eau (1958). No ano seguinte dirigiu Os Incompreendidos (Disponível na Globoplay), filme sobre o adolescente que vive mal com a mãe e o padrasto, detesta a escola e amadurece na marra, inspirado em sua própria infância e adolescência. Venceu o Festival de Cannes e ainda levou uma indicação para o Oscar na categoria melhor roteiro. Em janeiro de 1962, lançou Jules et Jim, (Disponível na Globoplay) com Jeanne Moreau no papel principal. O filme foi uma adaptação do livro homônimo do francês Henri-Pierre Roché, que conta o triângulo amoroso de três amigos. Definitivamente digno de figurar como sua ‘Magnum Opus”. Em setembro de 1966, dirigiu Fahrenheit 451, obra prima que adapta o livro homônimo do escritor norte-americano Ray Bradbury, obra distópica sobre uma sociedade totalitária na qual os livros foram banidos. Por esse filme, recebeu uma indicação do BAFTA e uma do Festival de Veneza, sendo seu primeiro filme colorido do cineasta.

No fim dos anos 1960, Truffaut e Godard romperam a longa amizade, iniciada na redação da “Cahiers du Cinéma“, e nunca mais voltariam a se falar. Truffaut venceu o Oscar de melhor filme estrangeiro com A Noite Americana, de 1973. Neste, ele também fala de amor, mas do amor pelo cinema. Tanto que resolveu interpretar o papel principal ele mesmo, falando sobre as dificuldades de terminar um filme e de fazer isso tendo de lidar com relacionamentos pessoais e profissionais difíceis. Em 1978, atuou no clássico Contatos imediatos do terceiro grau de Steven Spielberg. (Disponível na HBOMAX) Em 1983, Truffaut queixava-se de intensas dores de cabeça. Descobriu mais tarde que estava com câncer no cérebro. Cogitava fazer sua autobiografia, com o amigo Claude de Givray, mas os problemas de saúde o impediram de finalizá-la. Em 21 de outubro de 1984, François Truffaut fez sua passagem vitimado por um tumor cerebral. Suas obras são uma das maiores heranças da sétima arte, que valem a pena ser descobertas e redescobertas.