ENTREVISTA COM A DUBLADORA SUMARA LOUISE

Por Adilson Carvalho

Apresentação: Atriz, dubladora com 50 anos cobrindo filmes, novelas, desenhos, séries e propagandas. Desde 1973 emprestou seu talento com personagens marcantes como a a detetive Sabrina Duncan (Kate Jackson) em As Panteras, Cybill Shephard em A Gata & O Rato, todas personagens maduras, de temperamento forte. Entre 1980 e 1985 integrou o elenco de O Bem Amado, na Rede Globo, mas sem nunca ter deixado a dublagem. Durante muitos anos fez a Lucy Ewing (Charlene Tilton) em Dallas. A partir dos anos 2000, Sumara desacelerou sua carreira na dublagem devido ter assumido a presidência da ANAD (Associação Nacional dos Artistas de Dublagem). Neste período, fora “agraciada” com o epiteto de “Dama da Dublagem Brasileira” por seu corpo de trabalho. Tenho o prazer de entrevistar Sumara Louise.

Adilson: Como você começou sua carreira na dublagem ? Começou em 1973, quando eu encontrei a dubladora Selma Lopes, atriz maravilhosa, e ela estava gravando um filme. Ela me disse então “Você tem uma voz tão bonita ! Você já pensou em dublar ?”. Depois de um tempo nos tornamos amigas e ela voltou a insistir. Ela me levou para a Herbert Ritchers e eu fiz um teste com o Mário Monjardim. Eu fui aprovada e fui observar como era feito pois naquela época ainda não existia curso de dublagem. Assim eu assistia dubladores já atuantes como André Filho, Juraciara Diácovo, Darcy Pedrosa, Nely Amaral, e outros mestres da dublagem.

.Adilson: Na Globo você fez a série O Bem Amado. O que a levou a sair da dublagem para a frente das câmeras? Foi uma casualidade pois a Globo estava gravando nos estúdios da Herbert Ritchers e eu reencontrei o Régis Cardoso, que eu já conhecia. Foi ele quem me chamou. A Globo me ligou e assinei o contrato. Durante a série gravamos até no exterior, e quando acabou a série me perguntaram se eu queria continuar e me colocaram à disposição da Globo. Era muito desagradável ficar à disposição, ou seja, ganhava mas não trabalhava, então eu decidi ir até o RH da empresa e reinscindi meu contrato. Voltei para a dublagem porque sempre me senti muito à vontade. Sempre gostei.

Adilson: Na animação você fez a heroína Flutuadora no desenho do Galaxy Trio, da Hanna Bárbara, a Hera Venenosa em Batman Animated Series, além da Kate Jackson em As Panteras por três anos. Como a dinâmica de um desenho difere de uma série em termos de popularidade? De intonação de voz ? Fiz poucos desenhos, mas é muito bom ter a liberdade de criar um personagem animado. Eu tenho dificuldade para mudar a voz de acordo com o personagem. A Selma é uma mestre em adequar sua voz para bruxinhas e personagens assim. Claro, que os que eu fiz eu adorei fazer. Já em As Panteras usávamos um linguagem bem coloquial, e era ótimo ser parte de um trio de mulheres empodeiradas, como se diz hoje. Para a época eram bem avançadas e ditavam moda como era o cabelo da Jill Munroe (Farrah Fawcett) foi copiado por todos por muito tempo. Repetimos essa coloquialidade em A Gata & O Rato, o que era bem agitado porque tinha muito improviso e muito texto. A dinâmica da dublagem tem uma dinâmica bem diferente porque você vê, você escuta, você lê, você fala seus texto, você interpreta, tudo ao mesmo tempo. Em A Gata & O Rato não dava tempo para ler muito pois ao parar para ler, você automaticamente perdia algo. O Newton da Matta tinha muita experiência e me ensinou bastante. Já na animação há maior espaço para a criatividade.

Kate Jackson em As Panteras e Cybill Shephard em A Gata & O Rato

Adilson: Em A Gata & O Rato você brilhou ao lado de Newton da Matta, que dublou Bruce Willis. Como vocês alcançaram aquela sintonia já que as páginas de texto em A Gata & O Rato eram maiores que uma série convencional? Havia muita sintonia sim entre o Newton e eu, e ela foi elevada ao grau máximo ali em A Gata & O Rato. A gente combinava muito, a gente se dava muito bem. Tínhamos admiração pelo trabalho um do outro. Tínhamos que nos virar com os limites técnicos, por exemplo gravámos apenas em dois canais de áudio e o segundo, muitas vezes não funcionava. Era uma coisa de saber fazer de primeira e de confiar no trabalho um do outro. Foi um sucesso e nos divertíamos muito. Eu gosto muito de comédia.

Adilson: Voce já encontrou pessoalmente alguma das atrizes que você dublou como Bette Middler (Que Sorte Danada), Catherine O’ Hara (Os Fantasmas se Divertem), Kelly LeBrock (A Dama de Vermelho), a Glenn Close (Atração Fatal) entre outras ? Eu adoro fazer comédias, é muito rico e tenho uma veia cômica. Adoraria poder fazer uma vilã. Gosto muito de dublar e de honrar essas pessoas maravilhosas que me ensinaram tudo que sei. Sou muito grata a todos com quem dividi a bancada durante todos esses anos de carreira.

Adilson: Voce fez a Julie Christie (Dr. Jivago), Jean Simmons (Da Terra Nascem os Homens), Bille Burke (O Mágico de Oz), Natalie Wood (A Corrida do Século) entre outras de filmes Clássicos. Você já encontrou pessoalmente algumas das atrizes que você dublou ? Não, mas lembro de certa vez que eu estava em Las Vegas e de ter visto o Paul Newman do meu lado na calçada, prontos para atravessar. Fiquei enlouquecida por aqueles olhos azuis como dois diamantes. Mas fiquei surpresa de ver que ele era mais baixo do que eu imaginava.

Liz Taylor em Disque Butterfield 8

Adilson: No streaming você fez a Lucille Larusso (Randee Heller) em Cobra Kai da Netflix. O avanço do Streaming é positivo ou negativo em sua opinião ? Eu sempre ouvi que a televisão ia acabar com o rádio, e isso não aconteceu. Agora ouço que o streaming vai acabar com a TV e que a inteligência artificial vai acabar com a dublagem. Reconheço que esta é uma ameaça pois a IA pode aprender, captando uma determinada voz, como ela é modulada, como ela é flexionada e criar um carbono mal feito seja minha ou de todos nós. Isto é de fato um perigo para todos.

Adilson: Qual conselho você daria para quem gostaria de seguir a carreira de atriz e dubladora ? Acho que conselho nunca é o que as pessoas esperam conseguir. Bem difícil. As pessoas não sabem o desgaste de ficar o dia inteiro em um estúdio fazendo vozes de emoções, nem sempre agradáveis. As armadilhas que um filme, que um personagem muitas vezes traz. Eu cito como exemplo a Elizabeth Taylor (Disque Butterfield 8, Quem Tem Medo de Virginia Wolff?) , que eu dublei poucas vezes, mas todas que fiz ela era uma armadilha em potencial. Eu diria que o único conselho que posso dar seria “paciência” e “saiba ouvir seu diretor”.

Do questionário de Bernard Pivot:

Adilson: Qual som você mais gosta e qual você mais detesta? Não gosto de sons estridentes seja gente gritando ou uma multidão enfurecida. Tenho um ouvido muito sensível depois de todos esses anos dublando. Gosto muito do som de música, de todos os gêneros, mas claro que prefiro as músicas de minha geração.

Adilson: Que profissão diferente da sua você teria e qual você jamais teria ? Eu sempre tive vontade de ter estudado arqueologia. Eu estudei, acredite , economia. Veja só, quantas voltas a vida dá !

Adilson: O que você gostaria de ouvir Deus dizer quando você chegar no céu? Finalmente você chegou ou “Que bom que você chegou !” e ainda ouvir o latido de todos os cães que já tive. O latido de alegria porque eu lá cheguei.

Obrigado Sumara.

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