Por Leandro “Leo” Banner

Em 1984 chegou às bancas norte-americanas a primeira edição da maxissérie em 12 edições de SECRET WARS (aqui no Brasil, GUERRAS SECRETAS) com roteiro de JIM SHOOTER, desenhos de MIKE ZECK (com BOB LAYTON nas edições #4 e 5) e arte-final de JOHN BEATTY, JACK ABEL e MIKE ESPOSITO, que completa 40 anos de lançamento em 2024. Se hoje em dia essa introdução parece simples e corriqueira, algo como “mais do mesmo” para o leitor na casa dos 30, a coisa era bem diferente 40 anos atrás.

O leitor mais atento poderá observar que crossovers entre personagens existem desde a década de 1940, quando do primeiro encontro entre Namor e o Tocha Humana Original (Jim Hammond) publicado em MARVEL MYSTERY COMICS #8 de 1940, ou até mesmo as edições da Liga da Justiça da década de 1960 com as CRISES NAS MÚLTIPLAS TERRAS nas quais, ao menos uma vez a cada ano, a série sempre apresentava um problema em uma diferente Terra do Multiverso da DC Comics que demandava a união da Liga da Justiça com a Sociedade da Justiça, assim como a fraquinha TORNEIO DOS CAMPEÕES da Marvel no começo da década de 1980… no entanto , a grande diferença para GUERRAS SECRETAS de 1984 é que foi a primeira série a reunir um bando de heróis consagrados numa única grande saga que apresentou repercussões em seus respectivos títulos, o que era algo verdadeiramente inovador e, até então, nunca antes visto.
E pensar que tudo começou como uma reação ao contrato da DC com a Kenner Toys para produção de SUPER POWERS, uma linha de bonecos baseada nos personagens da Editora das Lendas. A despeito de a Marvel tentar há anos licenciar seus personagens, esse fator em especial foi determinante para que a Casa das Ideias fechasse um ajuste com a MATTEL para produção de uma linha de bonecos chamada SECRET WARS – GUERRAS SECRETAS no Brasil, e para promover o lançamento dessa linha a Marvel precisava de uma história. Assim sendo, foi criada a trama em que os principais heróis da Editora foram convocados por uma entidade divinal – o Beyonder – para uma batalha definitiva entre o bem e o mal. A trama não é das mais inspiradas e o roteiro mais ou menos de Jim Shooter não ajuda em absolutamente nada, ainda que tenha alguns momentos interessantes. Os desenhos de Mike Zeck são sempre muito bons – assim como os de Bob Layton, nas duas edições que desenhou – , mas em alguns momentos tem-se a impressão de uma produção apressada. É uma leitura agradável e divertida e, como já dito, com implicações relevantes nos títulos de linha dos personagens participantes. No fim do embate, as principais – e mais relevantes – modificações foram as seguintes: o Homem-Aranha ressurge na Terra com seu arrojado uniforme negro (cuja origem seria revelada alguns meses depois); a Mulher-Hulk assume o lugar do Coisa no Quarteto Fantástico, uma vez que ao final do conflito Ben Grimm opta por permanecer no planeta das Guerras Secretas, uma vez que lá conseguia reverter para sua forma humana à vontade; a paixão do X-Man Colossus por uma nativa do planeta leva ao rompimento de sua relação com Kitty Pride e o Hulk – que na época tinha o intelecto de Bruce Banner no controle do monstro – começa a perder esse controle.

PRIMEIRA PUBLICAÇÃO NO BRASIL. Na época em que a editora Abril começou a publicação de Guerras Secretas no Brasil (agosto de 1986), havia uma série de problemas editoriais advindos de escolhas equivocadas de todas as editoras anteriores (Ebal, Bloch e RGE) que haviam publicado a Marvel no Brasil anteriormente, o que resultou num tremendo desencontro entre entre a publicação da saga e o momento cronológico dos personagens em terras tupiniquins. Os Vingadores, por exemplo, ainda não tinham em suas fileiras a Capitã Marvel (Monica Rimbaud), Tempestade dos X-Men não havia adotado seu visual “punk” e as histórias do Homem-Aranha na revista de linha ainda estavam em 1982. O único personagem que tinham o momento cronológico adequado era o Hulk – que, de fato, estava muito à frente dos demais à época – e as consequências de sua participação nas Guerras Secretas puderam ser vistas no seu título de linha. Mas a Abril tinha um problema, e optou por resolvê-lo da forma mais esdrúxula possível, uma vez que tinha obrigação contratual de publicar a saga para promover o lançamento dos bonecos da MATTEL por aqui também. Optou pelas suas famigeradas “alterações” na primeira vez que publicou a saga, que consistiam em suprimir personagens – no caso a Capitã Marvel, que ainda nem tinha surgido no Brasil na época – e também alterar várias cenas da história, de modo que a série pudesse ser publicada naquele momento sem gerar uma série de questionamentos e dar spoilers de acontecimentos que ainda iriam ocorrer nas histórias (na época não havia internet, então era muito difícil ter conhecimento dos acontecimentos futuros dos personagens que ocorriam naquele – e também outros momentos – nas histórias originais nos Estados Unidos). Como exemplo dessas alterações, na história “adulterada” publicada pela Abril, Tempestade adota o visual “punk” no começo das Guerras Secretas e volta ao visual clássico no fim do conflito, o mesmo valendo para o Homem-Aranha que, depois de obter o uniforme negro, volta para o clássico no fim da trama, quando na verdade NÃO é o que ocorria na história original. Apenas anos depois (em dezembro de 1994), quando o momento cronológico permitiu, a Abril republicou GUERRAS SECRETAS sem adulterações a partir de A TEIA DO ARANHA #62. Muitos leitores expressaram grande revolta ao constatarem essas modificações promovidas pela Abril na época, mas o mérito dessa questão merece ser abordado em outro momento, não agora. A verdade é que GUERRAS SECRETAS realmente marcou época no momento de sua publicação, e aqui no Brasil não foi diferente, e nesse ano de 2024 comemoramos os 40 anos de seu lançamento.
Nos últimos anos, a saga vem sendo republicada com alguma frequência por aqui, tendo ganhado edição especial da Panini, publicação em dois volumes na Coleção Oficial de Graphic Novels pela Salvat, e agora retornou na coleção Marvel Essenciais da Panini.
Marcou época realmente, mas é uma história apenas razoável. Vale a pena pela leitura divertida e por ter sido uma publicação que alterou paradigmas.
Vida longa e próspera e até a próxima!🖖🏻