GALERIA DAS ESTRELAS | BURT LANCASTER

Por Adilson Carvalho

Poucos atores da clássica Hollywood conseguiram fazer tão bem a transição entre astro de Hollywood para grande intérprete como o ator novaiorquino Burton Stephen Lancaster, uma das grandes estrelas do panteão Hollywoodiano que nos deixou ha 30 anos.  Nascido em 2 de novembro de 1913, Burt Lancaster desde criança demonstrou um grande interesse em ginástica e na manutenção da boa forma física, o que o ajudou, quando na adolescência, se juntou ao circo, tornando-se hábil acrobata até se afastar em definitivo após um acidente que feriu sua mão. A arte imitou a vida quando Burt interpretou Mike Ribble, um ex acrobata que recupera o prestígio e o sabor da vida circence em Trapézio (Trapeze – 1956) , dividindo a cena com Tony Curtis e Gina Lollobrigida. Seu porte atlético e largo sorriso lhe rendeu o apelido “Mr.Muscles & Teeth” (Sr. Músculos & Dentes) bem como a imagem perfeita para o papel de aventureiro audacioso e viril perpetuado em papéis como O Pirata Sangrento (The Crimson Pirate – 1952) e O Gavião & a Flecha (The Flame & The Arrow – 1958).

Sua figura máscula e durona o levou a papéis marcantes como o boxeador no noir Assassinso (The Killers – 1946), sua estréia nas telas aos 33 anos ou o guerreiro índio em O Último Bravo (Apache – 1954). Entrou para a história do cinema seu papel do Sargento Milton Warden envolvido com uma mulher adúltera ( a esposa de seu oficial superior) no excelente A Um Passo da Eternidade (From Here to Eternity – 1952), adaptação do romance de James Joyce que tem como pano de fundo o bombardeio a Pearl Harbor. Sua cena de beijo na praia com Deborah Kerr tornou-se uma das mais antológicas do cinema. Curiosamente, conta-se que o próprio Burt Lancaster, de forte personalidade, teria se sentido intimidado em cena ao contracenar com Montgomery Cliff, intérprete do soldado Prewitt em A Um Passo da Eternidade!, sendo que ambos receberam indicação ao Oscar de melhor ator naquele ano em que William Holden se saiu vitorioso por Stalag 17. A estatueta dourada foi para as mãos de Lancaster em 1960 pelo papel de pastor evangélico pilantra em Entre Deus & O Pecado (Elmer Gentry).

De acordo com Kate Buford, autora da biografia Burt Lancaster – An American Life, o ator nutria um sentimento competitivo por Marlon Brando por ter perdido duas vezes para este grandes papéis: O de Stanley Kowalski em Uma Rua Chamado Pecado em 1951 foi oferecido primeiro a Lancaster que o recusou. O papel foi para Brando que ganhou então o Oscar e o de Don Vito Corleone em O Poderoso Chefão em 1974 que Lancaster se empenhou em conseguir mas foi para Brando, que ganhou seu segundo Oscar mas veio a rejeitar o prêmio. A determinação em se provar bom ator o levou a se arriscar em projetos menos comerciais como em O Leopardo (1963) do diretor italiano Luchino Visconti, que considerava seu melhor papel. Também foi um dos primeiro atores de Hollywood a desenvolver maior controle sobre sua carreira se tornando produtor. Fundou a Hecht-Hill-Lancaster e se associou a United Artists tendo inclusive produzido o grande sucessso Marty que em 1955 premiou Ernest Borgnine com o Oscar de melhor ator. Embora Burt Lancaster tenha recusado papéis icônicos como os protagonistas de Ben Hur e Sansão & Dalila (o ator se dizia ateu) , ele soube se reinventar e se mostrar versátil em papéis como o de repórter mau caráter em A Embriaguez do Sucesso (Sweet Smell of Success – 1957), prisioneiro redimido em O Homem de Alactraz (Birdman of Alcatraz – 1962), magistrado réu em Julgamento em Nurember (Judgment at Nuremberg – 1961) ou o lendário xerife Wyatt Earp em Sem Lei Sem Alma (Gunfight at the Ok Corral – este um dos sete filmes que fez com o amigo Kirk Douglas.

Lancaster tinha fortes convicções liberais, tendo se juntado a nomes como Charlton Heston, Sidney Poitier, Paul Newman e outros na histórica passeata de Agosto de 1963 liderada por Martin Luther King em Washington. Também apoiou a candidatura de John F. Kennedy e se posicionou contra a guerra do Vietnã e a favor de causas sociais. Suas atividades foram investigadas pelo FBI e o talentoso ator ganhou inimigos notórios como J.Edgar Hoover (que chamava Lancaster de subversivo) e Richard Nixon.
Ironicamente, ator – apesar de excelente atleta – não sabia nadar e aos 55 anos precisou treinar muito para o papel de nadador em O Enigma de uma Vida (The Swimmer – 1968) Na década de 80 permaneceu ativo apesar da redução dos bons papéis. Trabalhou no filme de Louis Malle Atlantic City (1980), foi um bilionário no premiado Momento Inesquecível (Local Hero – 1983) e , aos 74 anos, se reuniu com o amigo Kirk Douglas em Os Últimos Durões (Tough Guys – 1986) que brinca com sua chegada à terceira idade e com a imagem de machões que os dois mantiveram durante grande parte de suas carreiras. Com a escassez de papéis interessantes no cinema, trabalhou na Tv em mini-séries como Marco Polo (1982) e O Vôo da Águia (On Wings of Eagle – 1986) – adaptação da obra de Ken Follet sobre o resgate de prisioneiros americanos no Irã na época da queda do Xá e ascenção do Aiatolá Khomeini. Curiosamente, interpretou Moisés (mesmo sendo ateu confesso e se esquivando de papéis bíblicos) na mini-série A verdadeira história de Moisés em 1974. Em um de seus últimos papéis interpretou o espírito de um jogador de baseball no emotivo Campo dos Sonhos (Field of Dreams – 1989). Um de seus 5 filhos (Bill Lancaster) tornou-se ator e roteirista escrevendo Garotos em Ponto de Bala (The Bad News Bears – 1976) que se baseia no relacionamento com seu famoso pai e O Enigma do Outro Mundo (The Thing – 1982) – ficção científica dirigida por John Carpenter.

O Oscar afinal

Seu legado cinematográfico foi de um homem coerente com suas crenças, audacioso, ambicioso para superar seus limites, ou nas palavras de John Frankenheimer que o dirigiu mais de uma vez “Ninguém nunca se pareceu com Burt Lancaster“. 

Deixe um comentário