Por Mauricio Rocha

Em seus quase 130 anos desde sua primeira projeção, o cinema teve inúmeros grandes nomes. Desde a comédia com Charles Chaplin, Buster Keaton, Harold Lloyd, Jerry Lewis. Nos faroestes, John Wayne, Tom Mix, Randolph Scott, entre outros. Mas, no quesito de grandiosidade, espetáculo, só há um nome que ecoa até hoje: Cecil B. De Mille.
Se hoje temos um rosto para figuras históricas, devemos a ele. De Mille nos apresentou em carne e osso, Moisés, Sansão, Nero, Cleópatra, Marco Antônio, Júlio César, Ricardo Coração de Leão, entre outras figuras que fizeram parte da história da humanidade.
Em sua carreira de mais de 40 anos na sétima arte, De Mille fez aproximadamente, 70 filmes entre 1914 e 1959, ano de sua morte. Mas, antes de se tornar um dos maiores cineastas de todos os tempos, De Mille teve seu começo no teatro.
Rapidamente, sem tomar muito o tempo do leitor, só para ele se contextualizar em relação a De Mille. Nascido em 12 de agosto de 1881 em Ashfield, uma cidade no Massachussets, Cecil B. DeMille, filho de um membro da Igreja Episcopal, Henry De Mille (1853 – 1893) e de Matilda Berenice De Mille (1853 – 1923), o pequeno Cecil cresceu em um lar que exalava cultura e religiosidade. Seu irmão mais velho, William De Mille (1878 – 1955), se tornou um cineasta e também roteirista e dramaturgo. Não tão sucedido quanto seu irmão mais novo, porém, tendo uma grande importância no cinema dos anos 1920.
Mas, no início, Cecil B. DeMille, teve sua estréia no teatro em 1900. Atuou em diversas peças e já em 1910, começou a dirigir e escrever peças. William De Mille era o grande nome da Broadway, ao invés de seu irmão. E tendo uma esposa e filhos e devido aos fracassos nos palcos, em 1912, após assistir a um filme francês chamado Os amores da Rainha Elizabeth, ele já tendo perdido o interesse no teatro, decidiu migrar para outra forma de arte que pouco a pouco ganhava mais e mais visibilidade na cinzenta Nova York e na ensolarada Califórnia, onde, diversas produtoras surgiam para dar vida a uma nova forma de arte que começava a ganhar cada vez mais admiradores. Foi aí que iniciou a carreira cinematográfica dele.
Em 1913, ele juntou-se a Sam Goldfish (conhecido posteriormente por Sam Goldwyn, um dos fundadores da MGM) e de Jesse L. Lasky, um de seus futuros parceiros no ramo do cinema, De Mille no final de 1913, produziu Amor de Índio (The Squaw man), mas, o filme só foi lançado em 1914. Devido ao sucesso, De Mille fez outras duas versões de Amor de Índio, uma de 1918 e a outra já na era do cinema falado, em 1931.
Após o lançamento de Amor de Índio, o próprio irmão de Cecil, William, ficou tão impressionado com o resultado e com a qualidade da obra que ele próprio abandonou a Broadway e assim como o irmão, decidiu trabalhar com cinema.

Cartaz de Amor de índio (1914)
Mas, 1914 foi um ano triste para a humanidade. Foi o ano que eclodiu a I Guerra Mundial, que só terminaria em 1918. Entretanto, a carreira de De Mille se estabelecia pouco a pouco. Em 1915, D.W Griffith lançou O Nascimento de uma nação, filme que até hoje, causa polemica devido ao seu teor racista por colocar a Ku Klux Klan como mocinhos da história. Vendo a recepção um tanto negativa de sua obra, por mais que, na época, parte dos EUA fossem abertamente racistas, afinal, faziam poucas décadas que a escravidão havia sido abolida na Terra da Liberdade, Griffith lançou em 1916, Intolerância. É nítido o impacto destes dois filmes na obra posterior de De Mille.
Nos anos seguintes ao lançamento de Amor de índio, De Mille fez bastante filmes de faroeste, mas, pouco a pouco, foi se dando ao luxo de produzir filmes de época, como Carmem, baseada na obra de Georges Bizet e Joana, a mulher, filme que contava a história da recém canonizada, Joana D’Arc.

Geraldine Farrar em Joana D’Arc (1916)
Por mais que nestes anos iniciais, De Mille tivesse feito filmes de sucesso, foi somente em 1923 que De Mille cravou para sempre o seu nome na história do cinema. Fascinado desde criança pela Bíblia, DeMille flertava com a ideia de levar para as telas de cinema as histórias que tanto o fascinavam desde criança. A história de Moisés então foi levada as telas em 1923 por DeMille no filme Os Dez Mandamentos (The Ten Commandments).

Theodore Roberts como Moisés em Os dez mandamentos (1923)
A produção do filme iniciou no inicio de 1923 e foi gravado ao noroeste de Santa Barbara, na região de Guadalupe-Nipomo Dune, uma região repleta por dunas de areia que poderia facilmente se passar como o Egito Antigo. Uma curiosidade, há alguns anos, foram encontrados adereços no local usados no filme.
Para o papel de Moisés, De Mille escalou o veterano Theodore Roberts e Charles De Roche no papel de Ramsés. Enquanto a primeira parte do filme conta a história de Moisés e de como libertou o povo hebreu do cativeiro no Egito, a segunda parte conta um melodrama moderno (para a época) com base nos dez mandamentos bíblicos.

Ainda hoje, a cena da abertura do Mar Vermelho encanta os espectadores
Por fim, Os Dez Mandamentos tornou-se a 11ª maior bilheteria da época do cinema mudo e De Mille se tornou um nome associado para sempre aos épicos grandiosos de Hollywood, afinal, Os Dez Mandamentos foi apenas o primeiro de seus grandiosos épicos. Ainda na época do cinema mudo, ele fez alguns filmes contemporâneos, mas, tal qual seu sucesso colossal de Os Dez Mandamentos, seu próximo grandioso sucesso foi em 1927 quando ele produziu e dirigiu O Rei dos Reis (The King of kings), filme que conta a história de ninguém menos do que Jesus Cristo.

H.B Warner como Jesus em O Rei dos Reis (1927) na cena da ressurreição de Lázaro
O filme conta H.B Warner como Jesus de Nazaré em uma das versões mais icônicas da história do Messias. Com truques e efeitos da época do cinema mudo, o filme chama atenção em algumas cenas por ter sido filmado em technicolor: a cena inicial e a cena da ressurreição. Conta-se, que a cena da crucificação foi filmada na noite de natal de 1926 e tinha no set, D.W Griffith. Curiosidade, neste filme, Joseph Schildkraut interpreta Judas Iscariotes. Na década de 1930, ele atuaria em alguns filmes de De Mille. O último filme de Joseph Schildkraut foi A maior história de todos os tempos (The greatest story ever told; 1965), onde, também conta a história de Jesus Cristo, porém, nesta versão, ele interpreta José de Arimatéia. Ah, mais uma curiosidade, quem interpreta Caifás nesta versão de 1927, foi o pai dele, Rudolph Schildkraut.
Ainda em 1927, foi lançado O Cantor de Jazz (The Jazz Singer), filme que revolucionou a história do cinema. Mas isso, é tema para o próximo artigo sobre De Mille.
Mauricio Rocha, 06/06/2023