Por Adilson Carvalho

Uma das histórias mais intrigantes de Batman buscou inspiração na literatura, nas páginas de O Duplo, romance do escritor russo Fiódor Dostoievski, que narra as aventuras do conselheiro titular Goliadkin e das suas terríveis inquietações em torno de um colega que lhe usurpa a identidade enquanto seu homónimo. O escritor Mike W. Barr, então recém saído da minissérie Camelot 3000, imaginou que na mesma noite que Bruce Wayne perdeu seus pais no Beco do Crime, um outro menino filho de um casal de bandidos torna-se orfão quando seus pais são mortos por um policial no cumprimento do seu dever. A vida de Bruce e do menino sem nome correm em paralelo, mas enquanto Bruce se tornou o Batman para se opor ao crime e à injustiça, seu duplo se tornou um impiedoso assassino. De volta à Gotham City, depois de longos anos, ele assume a alcunha de Espreitador (Wrath) e planeja matar o homem que tirou a vida de seus pais, que é nada mais nada menos que o Comissário Gordon.

Na história, magnificamente desenhada pro Michael Golden, Bruce e seu duplo são lados diferentes da mesma moeda, ambos nascidos das falhas morais da sociedade entregue à criminalidade e à corrupção. Mike W. Barr conduz sua narrativa com um ritmo cinematográfico fazendo de cada página uma sequência de ação memorável, com Michael Golden distribuindo os quadrinhos de forma impactante, em ritmo crescente e levando o leitor ao esperado momento em que ambos se confrontarão de forma definitiva, pois só um poderá viver para continuar sua sina. A arte de Michael Golden em toda a edição é fenomenal (há uma razão para ele ter se tornado um dos nomes mais procurados no ramo), e a sequência de combate não é exceção, retratando dois combatentes incrivelmente habilidosos se enfrentando com tudo, com o Batman levando a pior, pois só ele está preocupado com as consequências fatais. A história foi planejada inicialmente para ser publicada em um Anual, mas acabou sendo publicado pela DC Comics em Batman Special #1, e no Brasil em Super Amigos #3 (julho de 1985). O autor é um aficionado de histórias de detetive e ficção científica, e nesta aventura presta uma homenagem a Ellery Queen, o nome usado por dois escritores que eram primos e, ironicamente, tinham outros pseudônimos: Frederic Dannay (na verdade, Daniel Nathan) e Manfred Bennington Lee (cujo nome verdadeiro era Manford Emanuel Lepofsky). Ellery Queen não é apenas o nome dos escritores, mas também o do personagem de suas histórias policiais e de mistério. No final desta edição, Barr dedica a história a Ellery Queen e dá exemplo, num ensaio, sobre outros clássicos com versões espelhadas ou negativas de personagens famosos (Dr. Jekyll e Sr. Hyde; Sherlock Holmes e professor Moriarty etc.). Em 2008, Tony Bedard e Rags Morales criaram uma segunda versão deste personagem (Elliot Caldwell) no Universo DC pós Crise Infinita. A estreia ocorreu em Batman Confidential # 13. O Espreitador também foi usado num episódio da quinta temporada do desenho animado The Batman, a série de 2004. Uma ótima história para orfãos do Batman.

O evento acontecerá nos dias 13 e 14 de setembro no Instituto Arte no Dique, Cine Roxy e Cinemateca de Santos. Criado em 2021 por André Azenha, crítico de cinema e produtor cultural autor de livros e realizador de exposições sobre o Cavaleiro das Trevas, o festival foi pioneiro no Brasil e surgiu como uma forma de homenagear o personagem Batman, criado por Bob Kane e Bill Finger em 1939.