Por Adilson Carvalho

Desde O Sexto Sentido (1998) o cineasta indiano M. Night Shymalan ficou refém de seu talento inegável de fazer do insolito um roteiro atraente e desafiador. Foi assim com Corpo Fechado (2000), Sinais (2001), A Vila (2004) e o excelente Fragmentado (2016). Embora seja discutível que algumas de suas histórias foram mal compreendidas ou mal recebidas, o fato é que Shymalan derrapou feio com os péssimos Fim dos Tempos (2008) e Vidro (2019). No caso de Armadilha (Trap) Shymalan está em ótima forma e mostra ter seguido a cartilha Hithcockiana, que apresenta um plot até simples mas cuja condução cena após cena constrói gradativamente um clima envolvente de suspense. Se por um lado não é inovador, por outro é café requentado do melhor tipo. Na história, o aparentemente pai de família Cooper (Josh Hartnett) leva a filha adolescente Riley (Ariel Donaghue) ao show da pop Star Lady Raven, papel de Saleka Shymalan, a filha mais nova do diretor, que é cantora na vida real e compôs e gravou todas as canções para o filme. Logo no início recebemos a informação de que Cooper é um serial killer e todo o show foi armado para captura-lo. O que se segue é um engenhoso jogo de gato e Rato com Cooper cada vez mais desesperado de fugir do lugar cercado pelo FBI, sob o comando da Dra Josephine Grant (Hayley Mills). As reviravoltas que se seguem são inteligentes, bem construidas e bem justificativas à medida que Shymalan habilmente transforma Cooper diante de nossos olhos fazendo-o assumir sua vilania de forma notável. Hartnett interpreta essa passagem muito bem e sabe fazer a transição de pai de família a algoz frio e insensível. M. Night Shyamalan declarou em uma entrevista que o enredo foi inspirado na operação “Operation Flagship” de Washington D.C. em 15 de dezembro de 1985, organizada pelo U.S. Marshals Service e pela Metropolitan Police para atrair fugitivos procurados para o Washington Convention Center sob o pretexto de ingressos gratuitos. A operação resultou em 101 prisões, uma das maiores e mais bem-sucedidas prisões em massa de fugitivos pela polícia dos EUA. Como um eficiente fan service, o diretor mostra cerca de dez minutos depois do início do filme, os carros da SWAT se aproximando na estrada, revelando um outdoor ao fundo anunciando o filme Os Observadores (2024), que foi produzido por M. Night Shyamalan e dirigido por sua filha mais velha Ishana Shyamalan. O público mais novo, no entanto, não percebe a presença da veterana atriz Hayley Mills, que foi estrela mirim em Pollyanna (1960), O Grande Amor de Nossas Vidas (1961) e Marcados Pelo Destino (1959). Fica aqui um eficiente thriller que mostra o valor de saber usar uma fórmula já batida e transforma-la em um produto interessante, como nas palavras de Shymalan, misturando O Silêncio dos Inocentes (1989) a um show de Taylor Swift.