Por Adilson Carvalho

A ideia de um paraíso no mundo é uma fantasia sempre desejada pelo ser humano, principalmente em tempos conturbados. O autor inglês James Hilton publicou em 1933 o livro Horizonte Perdido (Lost Horizon) imaginando a terra mística de Shangri-La, um lugar utópico nas montanhas do Himalaia longe da guerra e da ambição humana, onde as pessoas vivem vidas mais longas, e em absoluta harmonia. Na história, um grupo de pessoas, fugindo da guerra em um avião caem em ponto desconhecido no Tibet e chegam ao idílico reino de Shangri-La, de onde são impedidos de sair. Pressentindo que seu fim se aproximava, o sumo sacerdote do local escolhera o líder do grupo visitante para ser seu sucessor, mas este se vê forçado a levar seus companheiros de volta. A história investe no fascínio exercido pelo Oriente e na forma metafórica que trata das ambições, da longevidade e da natureza humana.
O livro captou a atenção do público, fez de Shangri La parte do imaginário popular, conquistando até mesmo o interesse do então presidente Franklin D. Roosevelt. No ano seguinte à estreia deste filme, o proprietário de uma próspera cadeia de cinemas contratou um arquiteto que desenhou uma mansão inspirada na Shangri-La deste filme. Localizada em Denver, Colorado, ainda hoje existe. Frank Capra tinha lido o romance de James Hilton durante as filmagens de Aconteceu Aquela Noite. Sua intenção era de filmar em cores, mas a limitação do orçamento não permitiu. Desde o início, no entanto, Capra deparou-se com dificuldades que resultaram em estouro de orçamento, como as despesas para filmagem na neve e nos interiores de aviões no Los Angeles Ice and Cold Storage Warehouse, onde a baixa temperatura afetava o equipamento e provocava grandes atrasos. Os cenários edificados para representar Shangri-La, concebidos por Stephen Goosson, foram construídos junto à Hollywood Way, uma rua movimentada durante o dia, o que obrigou a filmar à noite e aumentou consideravelmente as despesas com horas extraordinárias. Muitos exteriores foram filmados em Palm Springs, Lucerne Valley, Ojai Valley, no deserto de Mojave, nas montanhas de Sierra Nevada e no que é agora Westlake Village, acrescentando o custo do transporte do elenco, da equipa e do equipamento ao orçamento excessivo, entre outros gastos. A adaptação de Capra excedeu o seu orçamento original em mais de 776.000 dólares e demorou cinco anos para recuperar o seu custo. A grave crise financeira que criou para a Columbia Pictures prejudicou a parceria entre Capra e o chefão do estúdio Harry Cohn, bem como a amizade entre Capra e o roteirista Robert Riskin.

O próprio Harry Cohn ordenou a reedição do filme, à revelia de Capra, resultando em uma metragem de 132 minutos. Consequentemente, Capra entrou mais tarde com uma ação judicial contra a Columbia, invocando “desacordos contratuais”, entre os quais a recusa do estúdio em pagar-lhe o salário semestral de 100.000 dólares que lhe era devido. A 27 de novembro de 1937, Capra chegou a um acordo, tendo recebido o seu dinheiro e ficando dispensado da obrigação de fazer um dos cinco filmes exigidos pelo seu contrato. O filme veio a ser indicado a sete categorias do Oscar, ganhando o de melhor cenografia e melhor montagem para Gene Milford. Ao longo das décadas seguintes, o filme seria remontado com metragens diferentes para se ajustar a reprises nos cinemas, e à exibição na TV. Ronald Colman foi a escolha inicial e definitiva de Capra como o protagonista Robert Conway, dividindo a cena com Jane Wyatt e com a atriz mexicana Margo, contratada depois de Cohn recusar o nome de uma desconhecida Rita Hayworth. O filme seria refilmado em 1973 por Charles Jarrot com acréscimo de números musicais compostos pela dupla Burt Bacharach e Hal David. O resultado deste foi um fracasso de público e crítica. O filme de Capra teria um final feliz alternativo onde Sondra (Wyatt) vê Robert ( Colman) caminhando em direção a Shangri-La. A filmagem ainda existe, mas nunca foi usada.
Esteja conosco essa semana para conhecer um galante Senhor Deeds.