CLÁSSICO REVISITADO: OS CRIMINOSOS NÃO MERECEM PRÊMIO

No aniversário de Paul Newman, vamos conferir esse clássico da espionagem.

Por Adilson Carvalho

Politicamente, a guerra fria foi um período de extrema inquietude e paranóia, mas no campo da literatura e do cinema rendeu histórias ricas em ritmo e ação, basta mencionar James Bond – o maior expoente desse meio que tornou a figura do espião um herói charmoso. Incontáveis foram as histórias contadas dentro desse filão em que Bond é só a ponta do iceberg. Uma delas que completa agora 50 anos de seu lançamento e que é desconhecida do público em geral é “Os Criminosos Não Merecem Prêmio” (1963).

A trama segue a fórmula hithcockiana do suspense político onde um homem comum se vê envolvido em uma teia de intrigas. Durante a entrega do prêmio Nobel em Estocolmo, Suíça, o escritor norte-americano Andrew Craig (Paul Newman) descobre acidentalmente que o cientista Dr.Max Stratman (Edward G.Robinson – famoso pelos papéis de gangsters e vilões crueis), laureado com o Nobel de Física, foi trocado por um sósia enquanto o verdadeiro é enviado para trás da Alemanha Comunista (a chamada cortina de ferro) . Como tem má reputação por ser mulherengo e beberrão, a credibilidade de Craig é zero, principalmente por não esconder sua insatisfação e pouco caso com a premiação, que vem a ele em período de um incômodo bloqueio que o impede de escrever. Cada vez que, por conta própria, investiga a conspiração, Craig tem sua vida ameaçada sem que ninguém acredite nele, nem mesmo a polícia ou sua assessora, a bela Inger Lisa Anderson (Elke Sommer). Algumas sequências despertam tensão na mesma medida que humor como na cena em que ao se esconder de assassinos, o cínico escritor se refugia em uma conferência de nudista, provocando o maior tumulto.

Outros personagens se destacam na trama como Emily Stratman (Diane Baker) , a sobrinha do cientista sequestrado que parece saber mais do que diz, os médicos Dr.Carlo Farelli (Sergio Fantoni) da Itália e Dr.John Garrett (Kevin McCarthy) dos Estados Unidos que dividem os louros do mesmo prêmio com desconfiança de plágio e roubo, o físico dr. Claude Marceau (Gerard Oury) que traz sua secretária e amante para desgosto de sua esposa, a insatisfeita Dr.Denise Marceau (Micheline Presle), entre outros. No livro escrito por Irving Wallace, no qual o filme se baseou, todos os personagens são mais detalhados em suas motivações e problemas. O próprio protagonista no livro sofre o bloqueio por carregar a culpa por um acidente que causou a morte de sua esposa. A vida pessoal dos indicados ao Nobel é tratada de forma a humanizá-los, mostrando como pessoas que carregam dramas e decepções apesar do sucesso profissional que os levou ao famoso prêmio. O livro, lançado em 1961 foi uma das grandes obras de ficção do escritor norte americano Irving Wallace (1916 – 1990) e apesar de datado quanto ao pano de fundo que é a guerra fria, é um ótimo exemplo de narrativa envolvente e que acaba por servir bem como registro histórico do período retratado.

O filme dirigido por Mark Robson não esconde as semelhanças com Hitchcock já que tanto Intriga Internacional (1959) como Os Criminosos Não Merecem Prêmio (1963) foram roteirizados por Ernest Lehman. Outra coincidência é a presença do veterano Leo G.Carroll (1886 – 1972) que no primeiro interpreta o misterioso Professor, chefão do serviço secreto americano e no segundo faz o Conde Jacobsson, o paciente coordenador da premiação na Suiça. Além disso, tanto Cary Grant no caso de Intriga Internacional como Paul Newman em “Os Criminosos … ” interpretam personagens desacreditados, perseguidos por uma conspiração maior e envolvidos com mulheres misteriosas. Curiosamente, o próprio Paul Newman teve em sua vida uma relação de descontentamento com outro prêmio famoso, o Oscar que lhe foi conferido em 1986 por A cor do dinheiro depois de inúmeras indicações frustradas e trabalhos mais relevantes que a obra premiada. Quando ganhou, Newman teria dito “Ganhar um Oscar é como flertar com uma bela mulher durante anos. Quando ela finalmente se rende, você diz – agora estou cansado”.

No desenrolar da trama de “Criminosos não merecem prêmio” , todos os personagens tem suas vidas modificadas de alguma forma e tem faces de suas personas trazidas à superfície, sendo o ponto mais notável os médicos rivais que precisam unir seus conhecimentos ao final para salvar a vida do Dr.Stratman ou o próprio protagonista que é tirado de sua inércia física e mental ganhando novo estímulo criativo ao desvendar a trama que se revela nos bastidores do prêmio Nobel. Curiosamente, o próprio Paul Newman (1925 – 2008) voltou a se envolver com a guerra fria em outro filme do mesmo gênero Cortina Rasgada (1966) do mestre Alfred Hitchcock. O filme de Mark Robson é bem menos conhecido mas uma diversão agradável para quem goste do filão e lamentavelmente muito pouco reprisado na Tv, nem mesmo tendo sido lançado em dvd ou blu ray no Brasil. Aos que o conhecem o filme ou venham a ter a oportunidade fica uma movimentada e envolvente história em que o verdadeiro protagonista acaba sendo mesmo o citado prêmio, motivo pelo qual batiza originalmente a obra literária.

O filme não está disponível no streaming.

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