ENTREVISTA | SERGIO REZENDE

Por Adilson Carvalho

Uma pessoa de talento reconhecido de talento maravilhoso Sérgio Resende realizou grandes obras da nossa cinematografia, desde dramas e filmes históricos, tornando-se um de nossos melhores contadores de história. É pai também da diretora Julia Rezende.

Adilson : Sua belíssima carreira começou com curta metragens. No início da década de 70 mais ou menos você fez inclusive um curta sobre a Leila Diniz,  um dos grandes nomes do cenário artístico, um ícone eu diria aqui no Brasil como atriz, símbolo sexual e figura contestatória.  O que te levou a escolher a Leila, além de todos esses atributos, como um dos seus trabalhos iniciais ?

Sérgio: Foi em 1975 e eu era um jovem estudante quando resolvi fazer um filme sobre o dia de Finados, o dia dos Mortos que é também um dia de reconhecer as dores que sentimos da perda de pessoas da família, e assim fui ao cemitério São João Batista aqui no Rio de Janeiro. Lá eu passei em frente ao túmulo de Leila Diniz, que tinha morrido três anos antes. Foi quando a Marisa, que era a minha namorada e com quem me casei, me disse que deveríamos fazer um filme sobre a Leila Diniz. Tive a ajuda inestimável de vários amigos trabalhando de graça. O saudoso Paulo José fez a locução do filme de graça, o Milton Nascimento, que era amigo da Leila, compôs três canções para o filme. Com seu tino de produtora a Marisa percebeu que a Globo não tinha feito nada sobre a Leila. Ela foi lá e vendeu o filme para o Fantástico, que exibiu um curta na íntegra pela primeira vez,  então percebemos que era possível ganhar algum dinheiro com o cinema. Depois fiz outro curta chamado P.S. Te Amo baseado num livro num livro do Abel Silva do grande letrista popular e ganhou o Festival JB de curta metragem, que era maior festival que existia no Brasil naquela época. Aí uma coisa vai puxando a outra né e te estimula quando você é bem sucedido daí eu fiz meu primeiro longa documentário Até a Última Gota, em 1980,  também ganhou um prêmio em Cuba, ganhou um prêmio na Alemanha e abriu portas para mim na Embrafilme, que existia naquela época. Aí apresentei o roteiro que escrevi que veio a ser minha primeira obra de ficção, O Sonho Não Acabou. O Celso Amorim, que hoje é chanceler, diplomata, era o presidente da Embrafilme, aprovou o filme e aí começou a minha carreira.

Adilson: O Sonho Não Acabou, ele trouxe naquela época uma geração nova de atores: Lauro Corona, Miguel Falabella, Lucélia Santos, Chico Dias, Daniel Dantas, primeiro filme de todo mundo, e você praticamente o padrinho dessa geração, né ? E com isso você iniciou um legado que vem até hoje através de vários outros trabalhos. O sonho para você realmente não acabou, o sonho de tudo que o cinema brasileiro pode render e ainda temos tanto a mostrar, mas a população ainda é carente cinematograficamente falando. Quero dizer que ainda há muitas pessoas que preferem assistir a um blockbuster americano que um filme nosso.  Então, daí a pergunta,  o sonho de fazer cinema ainda vive ou não?

Sérgio: O sonho continua não somente para mim mas para todos. Quando a Embrafilme acabou no começo dos anos 90, durante o governo Collor, parou tudo. Mas quando o cinema recomeçou, para meu espanto, havia dezenas de novos realizados. O Brasil ama fazer cinema, e nem todo país consegue se expressar com o audiovisual. Hoje em dia abriram novos mercados, como a televisão e o streaming, cheio de gente nova cheios de talento. Não é mais um sonho, é uma realidade, é uma atividade econômica que gera empregos, e é uma atividade cultural também. Eu acredito muito que a gente ainda vai alcançar um patamar de reconhecimento maior perante a sociedade, perante o público eu me vejo um sonhador enfim.

Adilson: Sérgio você, além de diretor, também é roteirista como em A Maldição de Sanpaku (1991), do qual também é autor do argumento. Em 1983 você também roteirizou e dirigiu O Homem da Capa Preta além de outras obras. O que  te apaixona mais é escrever ou dirigir ? Muito importante para jovens que pensam em seguir uma carreira  escrevendo e dirigindo filmes .

Sergio: Eu me apaixono por contar histórias. Faço cinema porque eu escrevo. Eu não tive uma formação acadêmica, não fiz Escola de Cinema, não fiz escola de fotografia, eu simplesmente escrevia, imaginava coisas e queria escrever sobre essas coisas. Mesmo Por exemplo quando eu fiz O Sonho Não Acabou minha primeira obra de ficção, eu nunca tinha sido assistente de direção de ninguém, nunca tinha entrado antes em um SET de filmagem. Aí uma vez me perguntaram “Como você quer então fazer isso?” e eu disse “Porque eu criei essa história, eu a conheço e me sinto capaz de colocar em imagens o que eu escrevi”. Então a partir daí escrevi o roteiro de todos os meus filmes, sempre com algum parceiro, com exceção por exemplo de Lamarca (1994), que foi roteiro do Alfredo Oroz e também O Paciente (2017), roteiro do Gustavo Lipsztein.  Adoro a parceria, acho que a troca enriquece. Por outro lado, escrevi sozinho o roteiro de O Jardim Secreto de Mariana (2012). 

Adilson: Falando em escrever, eu noto na sua filmografia uma paixão por história. Você dirigiu várias biografias, várias passagens históricas como O Homem da Capa Preta (1983) que foi a história de Tenório Cavalcante, figura icônica em Duque de Caxias. Depois temos ainda a Guerra de Canudos (1997) que é uma passagem histórica importantíssima do país, temos Lamarca (1994) e recentemente também houve O Paciente (2017). Afinal, por que a História te fascina tanto ? 

Sergio: O cinema vive de grandes histórias e grandes personagens. Quando você vai ver o faroeste, ninguém diz que é um filme que é uma biografia, mesmo quando você pega um filme que é ambos.  Mas não é a biografia a história dos grandes personagens ? Então eu tenho muito interesse por uma história com e isso é o que eu acho, que eu tenho  alternado muito ao longo do tempo fazendo um trabalho de ficção como O Sonho Não Acabou, e  depois O Homem da Capa Preta, que era baseada na vida do Tenório Cavalcanti. Eu fiz também Doida Demais, que era uma história inteiramente original. Mas eu acho que os filmes geram no público uma curiosidade e muita gente que acha que eu sou especialista nesse assunto. Bem eu sou fascinado por esses temas e vejo pegar uma história para filmar como se fosse criar um negócio tipo uma sorveteria onde você tem que ter vários sabores para experimentar. Eu particularmente sou apaixonado por filmar histórias. Eu acho que rever a história permite fazer uma análise revisionista desta e que os filmes permitem, e eu acho isso muito importante no Brasil, porque a memória do povo é curta. 

Adilson: Então, precisamos revisitar mais nossa história, não ?

Sérgio: Então realmente filmes com fundamentos históricos permitem que uma nova geração conheça, que tenham contato com aquilo que desconhecem. Isso não acontece como nos Estados Unidos, que  fizeram da sua do avanço para o Oeste , da Conquista do Oeste um gênero cinematográfico que se chama faroeste. Aí depois eles fizeram filmes que pareciam videoclipe, e aí você tinha uma prateleira com filme de guerra e assim eles contam a sua história. Somente nós brasileiros sabemos contar nossa própria história. 

Adilson : Além de ator, José Wilker também era crítico cinematográfico. Você trabalhou com ele em O Homem da Capa Preta, e mais tarde ele fez Antônio Conselheiro em Guerra de Canudos. Como foi trabalhar com essa lenda que José Wilker foi ? 

Sérgio:  Ele se tornou um grande parceiro, um grande amigo no final e a gente acabou fazendo esses dois filmes que você mencionou. Ele me ajudou a levantar os recursos para fazer um filme então aquela coisa de amigo e parceiro Incondicional né E tem uma recordação dele assim tipo a mais calorosa. 

Adilson: Que conselho você daria para uma nova geração que quer fazer cinema?

Sergio: Eu diria, escreva. Escrever é mais difícil que dirigir. É igual a Lego brincadeira de criança que eu fico brincando com meu neto. Eu digo,”Faça a base se você quer que eu leve suba vai fazendo uma base grande ai que depois você vai colocar as peças aqui não vai uma altura grande. Se a base for muito pequenininha ele vai cair no primeiro sopro Então acho que a base do cinema é a narrativa, são as histórias que você vai contar e quanto mais você se fortalecer nisso melhor eu acho que o filme ficará.

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