Celebrando os 109 anos do nascimento do escritor Road Dhal.
Por Adilson Carvalho

Road Dhal nasceu no País de Gales em 13 de setembro de 1916 em meio ao primeiro conflito mundial. Tendo perdido sua irmã mais velha e seu pai muito cedo, o talentoso escritor foi criado pela mãe que o educou em escolas inglesas. Por volta dos treze anos, ele estudava na Repton School, em Derbyshire, que costumava receber caixas de chocolate da tradicional fábrica Cadbury para que os jovens provassem os produtos antes de sua comercialização. Em retribuição, a Cadbury dava a Dahl e os demais presentes, os deliciosos produtos da empresa. Dhal, inclusive, sonhava em inventar uma nova barra de chocolate que chamasse a atenção da empresa fundada por John Cadbury no final do século XIX. O episódio foi a inspiração anos mais tarde para que Dahl escrevesse a história de “A Fantástica Fábrica de Chocolate” : O menino Charlie Bucket é sorteado junto a quatro outras crianças, com o bilhete dourado que os levará a um passeio pela fábrica do recluso chocolateiro Willy Wonka. Dessa história surgiu um dos meus filmes favoritos da infância, clássico da “Sessão da Tarde” de minha geração e hoje às vésperas do dia das crianças uma doce lembrança que o CCP compartilha com vocês.

As coincidências entre a Cadbury e o livro de Dahl são várias: Em 14 de Agosto de 1990, a Cadbury inaugurou um parque temático em Bourneville, no Reino Unido, próximo à fábrica e que atrai milhares de visitantes. O local parece o cenário da história de Dahl com brinquedos e atrações que fazem o visitante se sentir um lugar mágico com rios, cascatas e montanhas. Além disso, o logotipo das barras de chocolate carregam a assinatura estilizada de William Cadbury, lembrando o nome Wonka retratado nas adaptações do livro para o cinema. A diversidade de produtos Wonka reflete na ficção a variedade da Cadbury com chocolate ao leite em barra (surgido em 1905), chocolate ao leite com flocos de arroz, com caramelo, biscoito wafer e uma infinidade de outros que faz da Cadbury a marca preferida dos ingleses e, mundialmente, uma das maiores concorrentes de nomes como a Nestlé, Hershey ou a Ferrero Rocher.

Na história de Dahl, cada criança personifica um aspecto moralizante da educação infantil: Augustus Gloop é o guloso, Veruca Salt a menina mimada, Violet Beauregard a menina fútil e competitiva e Mike Tevee o viciado em televisão. A medida que os quatro são eliminados pelas falhas advindas de sua má criação, os Oompa Loopas, o povo diminuto que trabalha na fábrica, cantarola cantigas moralizantes que transmitem os pensamentos de seu autor, que sempre se preocupou em contar histórias que tivessem um efeito positivo sobre as mentes jovens. Sua narrativa é simples em seu desenrolar e consegue criar um forma de entretenimento educativo. Tal mensagem atinge o público leitor de faixas etárias bem distintas, tanto crianças como adultos se encantam com a mensagem de que a sorte favorece aquele que é humilde. Charlie vence a competição sem saber que o grande prêmio ao final seria se tornar o herdeiro do excêntrico Wonka, e ainda lhe ensina que o valor real da vida não é o dinheiro mas o amor de uma família. Dahl fez de Charlie a personificação de sua visão de mundo em que a recompensa vem para quem é puro de coração. Ferrenho crítico da televisão, o autor escreveu um poema apontando o perigo de ser criado de frente para um aparelho de TV, posição essa que espelhou através do personagem de Mike Tevee. Quando o livro publicado pela primeira vez, no entanto, os editores ficaram preocupados com a descrição dos Oompa Loompas, que segundo as palavras do autor seriam pigmeus com a cor de pele escura. Vivia-se na época a época dos conflitos com os direitos civis e a editora temia que isso atraísse acusações de racismo, levando o autor a mudar a descrição dos Oompa Loopmas a partir da segunda edição. Muito depois o autor escreveu a continuação “Charlie & O Elevador de Vidro” (Charlie & The Great Glass Elevator), publicado em 1972 e que, em vida, nunca permitiu que fosse adaptado para o cinema por ficado extremamente descontente com a adaptação de 1971, dirigida por Mel Stuart.

A princípio, o próprio autor ficara a cargo da adaptação do texto, mas a demora em cumprir os prazos fez com que ele fosse substituído por David Seltzer. As mudanças que se seguiram na história desagradaram muito ao autor. Primeiro, ele repudiou a escolha do ator americano Gene Wilder para o papel de Willy Wonka, que para o autor não era o principal personagem e foco da narrativa, e sim o menino Charlie. Como a Quaker Oats era a patrocinadora do filme para o qual investira 3 milhões de dólares, chegando a produzir barras de chocolate Wonka como parte da campanha promocional, o título do filme veio a ser rebatizado “Willy Wonka and The Chocolate Factory”. Lamentavelmente, as barras de chocolate derretiam muito rápida e tiveram que ser recolhidas das lojas antes que estragassem. Das canções escritas pelo próprio Dahl, somente uma delas foi usada, sendo as demais canções compostas exclusivamente para o filme. Na sequência em que a menina Veruca é eliminada da competição, o texto original traz esquilos que separam as nozes boas das ruins. A menina Veruca invade a sala dos esquilos porque quer ter um dos animais e, por isso, é jogada fora da sala pelos próprios animais. No filme de 1971, os esquilos são trocados por gansos e as nozes por ovos. Na versão de Tim Burton de 2005, os esquilos e as nozes são mantidos. As filmagens foram feitas na Alemanha e foi difícil para o departamento de elenco encontrar pessoas de baixa estatura para interpretar os divertidos pigmeus pois durante a era nazista anões e outras pessoas consideradas imperfeitas eram simplesmente mortas. Os pequeninos, incluindo entre eles uma mulher, não falavam inglês e tiveram grande dificuldade para cantarolar os números musicais. Além disso, os cenários extremamente coloridos despertaram comentários maldosos de que o filme parecia uma viagem psicodélica de drogas. Mais de 150 mil litros de água misturada com creme e chocolate foram usadas para criar o rio de chocolate, o que resultou em uma mistura que com pouco tempo passava a exalar um cheiro desagradável incomodando a atores e equipe, atrasando as filmagens.

Quando Tim Burton refilmou, conseguindo permissão dos herdeiros de Road Dahl , prometeu corrigir tudo o que o filme de Mel Stuart modificou. Além de ter mantido o título original (Charlie & The Chocolate Factory), Burton foi mais fiel ao texto. A escolha de Johnny Depp, que era alérgico a Chocolate quando criança, para o papel de Wonka, no entanto, deu ao personagem um visual por demais caricatural e preso aos maneirismos do ator. Ainda assim, a fidelidade do filme à obra é mais visível e ganha na tela a cada criança eliminada, o que reflete a visão de seu escritor. As canções de Dahl foram utilizadas (quatro delas) e a sequência dos esquilos, trocados por gansos no filme anterior, mantida tal qual no livro. Para os Oompas Loompas Burton usou o ator Deep Roy multiplicado digitalmente para parecer as centenas, que nas sequências musicais era dublado por Danny Elfman, cantor e compositor eventual colaborador de Burton. O papel de Wilbur Wonka (Christopher Lee), pai de Willy, foi escrito especificamente para o filme, não existindo portanto no texto de Dahl. O problema com a versão de Tim Burton é que apesar de se preocupar em preservar elementos da história original, Burton impregnou a história com muitos tons góticos, que nunca fizeram parte do livro nem da versão com Gene Wilder. Outra falha foi a atuação de Johnny Depp, muito acima do tom que fizera Willy Wonka tão icônico. Sua atuação é exagerada na bizarrice e não se conecta com o elenco infantil, embora o pequeno Freddie Highmore (The Good Doctor) – então com 13 anos – brilhe no papel de Charlie. E você que leu esse artigo, quem é seu Willy Wonka favorito?