Leandro Banner

Depois que o desenhista Herb Trimpe assumiu como artista regular da série do Incrível Hulk sob os roteiros de Archie Goodwin e Gary Friedrich, Stan Lee retornou ao posto em THE INCREDIBLE HULK # 108 para uma leva final de histórias do gigante verde que consolidaram as características centrais da mitologia do Hulk: a dualidade entre Bruce Banner e seu alter ego monstruoso, a incompreensão da humanidade frente à sua força bruta, a perseguição constante do Exército — personificada pelo general “Thunderbolt” Ross — e o drama afetivo do amor praticamente impossível com Betty Ross. Nessa altura, o Hulk se afirmara como uma figura trágica, um anti-herói movido mais por instinto e sofrimento do que por objetivos heróicos. As histórias alternavam entre a chegada na Terra Selvagem com confrontos com Ka-Zar e aventuras cósmicas, assim como confrontos com vilões recorrentes (como o Líder e o Rino) e tramas que exploravam a dimensão psicológica da metamorfose de Banner. Essas histórias serviram também para que o então novato Herb Trimpe se desvinculasse do estilo de Marie Severin e adotasse seu próprio estilo de arte, com alguma leve influência de Jack Kirby em alguns momentos. Trimpe não era de longe o melhor desenhista, mas mantinha uma regularidade e qualidade aceitáveis, ainda que vacilasse em alguns pontos. Stan Lee se despediu do título definitivamente na edição #120, de julho de 1969, na qual providenciara o argumento, deixando o roteiro a cargo de ROY THOMAS, que assumira o posto de roteirista regular do título pelos próximos dois anos, seguindo com Herb Trimpe nos desenhos, numa história publicada no Brasil até o momento em PRÍNCIPE SUBMARINO E O INCRÍVEL HULK (SUPER X) #45 pela EBAL (1971), e O INCRÍVEL HULK #9 pela Bloch (1975). É possível perceber que Roy Thomas imprime uma abordagem própria, ainda que respeitosa em relação ao que Lee havia estabelecido. Thomas, conhecido por seu estilo meticuloso e por expandir a coesão do universo compartilhado da Marvel, trouxe ao Hulk uma ênfase maior na continuidade interna e no aprofundamento psicológico.

Seu trabalho buscou explorar de maneira mais consistente a condição trágica de Banner, enfatizando a luta do cientista contra uma maldição sem cura aparente. Além disso, Thomas introduziu um cuidado especial na caracterização dos coadjuvantes: o drama de Betty Ross ganha mais densidade, e o general Ross é mostrado não apenas como antagonista obstinado, mas também como figura militar dividida entre dever e sentimentos pessoais e as motivações do Major Talbot ganham mais profundidade em razão de seu amor não correspondido por Betty Ross, conferindo mais camadas e complexidade às personalidades dos coadjuvantes. O mandato de Roy Thomas como roteirista do gigante verde tem como destaques:
— Introdução de Jim Wilson como novo “parceiro mirim” do Hulk. Depois de ser separado de seu alter ego monstruoso em THE INCREDIBLE HULK #130, na edição seguinte o Hulk conhece JIM WILSON, um adolescente que vivia de praticar pequenos delitos para sobreviver, e que tem seu destino ligado ao Hulk para ajudar o monstro a destruir sua odiada contraparte. Essa sequência foi publicada no Brasil em PRÍNCIPE SUBMARINO E O INCRÍVEL HULK (SUPER X) #52-53 pela EBAL (1972), O INCRÍVEL HULK #12-13 pela Bloch (1976) e BLOQUINHO EXTRA APRESENTA #9 também da Bloch (1978);
— O surgimento do mundo subatômico de K’AI num díptico concebido por HARLAN ELLISON e adaptado por Roy Thomas, que se inicia em AVENGERS #88 (que até o momento só teve duas ou três páginas publicadas no Brasil em O INCRÍVEL HULK #19 da Abril (1985)) e continua em THE INCREDIBLE HULK #140, com a primeira aparição da princesa JARELLA, que conquistaria o coração embrutecido do Hulk e de Bruce Banner, o que causaria pouco tempo depois a ruptura entre o cientista e Betty Ross, com o consequente casamento da filha do general com o major Glenn Talbot.
— A primeira aparição de LEONARD SAMSON na edição #141, publicada no Brasil em O INCRÍVEL HULK #16 da Bloch (1976) e O INCRÍVEL HULK #3 da RGE (1979), numa história que, a despeito de sua relevância por trazer a estreia de um personagem essencial na mitologia do gigante verde, é tenebrosamente RUIM por mostrar Bruce Banner como um homem simplório, mesquinho e medíocre que, depois de ser “curado”, decide novamente se tornar o Hulk por inveja e ciúmes. História horrorosa! 🤬🤮

Depois disso, em meados de 1971, Roy Thomas se afastaria do título como roteirista regular, assumindo a função de Editor no lugar de Stan Lee, embora ainda tivesse algumas poucas e eventuais participações posteriores como argumentista em algumas tramas. A despeito de seus tropeços, a fase de Roy Thomas ajudou a consolidar o Hulk como um dos personagens mais complexos da Marvel. O herói deixou de ser apenas uma força da natureza a ser contida e passou a representar, de forma mais clara, a tensão entre humanidade e monstruosidade, liberdade e repressão, ciência e instinto. Com isso, Thomas preparou terreno para as fases seguintes, especialmente a de LEN WEIN , que expandiriam ainda mais o alcance do personagem e suas metáforas sociais. Na próxima oportunidade falaremos um pouco mais sobre JARELLA, a primeira aparição de WOLVERINE e o excelente título do gigante verde que praticamente NUNCA foi publicado no Brasil.
Vida longa e próspera e até a próxima!🖖🏻
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