CECIL B. DE MILLE – O HOMEM QUE FEZ DO CINEMA UM ESPETÁCULO (PARTE 2)

Por Mauricio Rocha

Quando Al Jolson cantou “Mammy” em O Cantor de Jazz (The Jazz Singer; 1927), o mundo, não só do cinema, mas, o mundo mudou. Ali, era possível escutar a voz de seus artistas favoritos. Uma revolução estava prestes a iniciar no final dos anos 1920 com o som se unindo as películas mudas. Um pequeno adendo, uma pena que Rodolfo Valentino (1895-1926) não pode ver isso. O grande galã havia falecido em agosto de 1926 deixando milhares de fãs (mulheres) se sentindo “viúvas”. Claro, havia quem torcia ferozmente o nariz para o cinema falado, entre eles, Charles Chaplin, que costumava dizer que era uma moda passageira. Discordo do grande mestre do cinema e ele próprio voltou atrás quando em 1940 lançou a obra prima O Grande Ditador.

Pôster de Madame Satã (1930) seu segundo filme falado

Mas, o tema aqui é dar continuidade ao Cecil B. De Mille. Depois do sucesso estrondoso de O Rei dos Reis (1927), iniciou a era do cinema falado e De Mille foi um dos que melhores aproveitaram aquela maravilha. Em 1929, lançou Dinamite (Dynamite; 1929). Mas, Madame Satã (Madam Satan; 1930), um dos filmes mais conceituados dos anos 30. Porém, logo em seguida, De Mille fez sua terceira versão de Amor de Indio, só que desta vez, na era do cinema falado. Após a terceira versão de seu primeiro filme, ele voltou ao gênero que tanto sucesso lhe deu na década passada e produziu e dirigiu o épico O Sinal da Cruz (The Sign Cross; 1932). O filme apesar de ter um enredo semelhante a Quo Vadis? não é baseado na obra do polonês Henryk Sienkiewicz. O filme conta a história de Mércia, interpretada por Elissa Landi, uma jovem cristã e de Marcus Esperbus, interpretado por Fredric March  que vivem nos dias do imperador Nero, onde, ele manda incendiar Roma, já na cena de abertura, interpretado pelo excelente Charles Laughton. A esposa de Nero, Popeia Sabina, interpretada pela maravilhosa Claudette Colbert, nutre um ciúme quase doentio por Marcus, até que, junto com o puxa saco do imperador, Tigelino, interpretado por Ian Keith, incentivam o imperador a culpar os cristãos pelo incêndio de Roma e persegui-los. Apesar de ser um filme de temática religiosa, o filme sofreu boicote por causa da censura em algumas cenas consideradas “picantes” para a época.

Fredric March e Claudette Colbert em O Sinal da Cruz (1932)

Em 1934, ele produziu Cleópatra (Cleopatra; 1934), interpretada por Claudette Colbert em uma das performances femininas mais famosas de todos os tempos. A beleza e a sensualidade de Colbert contribuíram muito para o filme. O filme foi um grande sucesso na época. Um critico do New York Times escreveu “Um dos espetáculos mais ambiciosos do diretor”. O filme também marca o inicio da parceria do diretor com o ator Henry Wilcoxon, que trabalharia com De Mille em praticamente, todos os seus filmes daqui para a frente.

Marco Antônio (Henry Wilcoxon) corteja Cleópatra (Claudette Colbert)

No ano seguinte, ele produziu e dirigiu As Cruzadas (The Cruzaders; 1935), também estrelado por Henry Wilcoxon, onde, ele interpreta Ricardo Coração de Leão, rei da Inglaterra que vai até a Terra Santa combater os muçulmanos liderados por Saladino (Ian Keith). Novamente, mais um sucesso na carreira do diretor. Mas, a partir de 1936, ele foi lançando poucos filmes. Se antes, lançava um ou dois filmes por ano, foi diminuindo a produção de seus filmes.

Poster de As Cruzadas (1935)

Em 1938, lançou O Corsário sem pátria (The Buccaner; 1938) baseado na história de Jean Laffite, com Fredric March. Anthony Quinn faz uma de suas primeiras participações no cinema nesta obra. Naquela época, ele era casado com Katherine De Mille, filha de Cecil. Em 1939, lançou Aliança de aço (The Union Pacific; 1939) e no ano seguinte, lança Legião de heróis (North West Mounted Police; 1940) com Gary Cooper. O filme marca o incio da parceria do diretor com a atriz Paulette Goddard, na época, casada com Charles Chaplin que produzia O Grande Ditador. Ainda na década de 1940, De Mille lançou mais dois faroestes: Vendaval de paixões (Reap with the Wind; 1942) e Os inconquistáveis (Unconquered; 1947), ambos com Paulette Goddard.

Paulette Goddard (1910-1990) em Legião de Heróis (1940) atuou em quatro filmes de Cecil B. De Mille na década de 1940

Mas, em 1949, ele lança um de seus últimos filmes. Aliás, um de seus mais famosos, sem dúvida: Sansão e Dalila (Samsom and Delilah; 1949). Filme conta a famosa história bíblica de Sansão, um titã que se apaixona por uma cortesã filisteia chamada Dalila. No filme, Sansão (Victor Mature) se casa com a irmã de Dalila, Semadar (Angela Lansbury) e na noite de núpcias, sua esposa é assassinada e Sansão inicia uma revolta contra os invasores filisteus. Dalila jura vingança contra Sansão, custe o que custar. Hedy Lamarr interpreta Dalilia e sua beleza estonteante é mais espetacular do que próprio espetáculo que De Mille nos oferece em tela, em especial, duas cenas que eu considero algumas das melhores já filmadas na história do cinema: a primeira, é a cena onde, Sansão sendo levado preso pelos filisteus se liberta e mata praticamente todos os inimigos. E a segunda, a cena final, onde, Sansão destrói o templo filisteu. Destaque para George Sanders e Henry Wilcoxon, que interpretam os antagonistas do filme. Ironicamente, Burt Lancaster foi cotado para o papel de Sansão e recusou. Com a morte de Angela Lansbury ano passado, só Russ Tamblyn continua vivo do elenco. Russ Tamblyn fez uma participação em Django Livre (2012).

Entrando na década de 1950, De Mille faz uma participação em Crepúsculo dos deuses (Sunset Boulevard ; 1950), onde, interpreta ele mesmo em uma cena com sua antiga parceira de filmes, Gloria Swanson. Na década de 50, o cinema tinha um concorrente a altura. Pelo menos, assim se descreve tal concorrente na época: a televisão. Em 1952, De Mille faz seu penúltimo filme: O maior espetáculo da terra (The greatest show on Earth; 1952). O maior espetáculo da terra foi o único filme de De Mille a vencer o Oscar de Melhor filme. O filme tem um excelente elenco: Cornel Wilde, Betty Hutton, James Stewart e Charlton Heston.

Entretanto, durante uma viagem a Itália para o lançamento de O maior espetáculo da terra, De Mille e Charlton Heston foram visitar a estátua de Moisés que fora esculpida por Michelangelo. De Mille ficou tão fascinado com a semelhança de Heston com Moisés de Michelangelo que não conseguiu tirar isso da sua cabeça. Então, De Mille decidiu que seu próximo filme não seria somente um filme, mas, um testamento para as gerações futuras de cinéfilos de todo o mundo. De Mille então decidiu refilmar seu maior sucesso do cinema mudo: Os Dez Mandamentos.

Incrível a semelhança entre Moisés de Michellangelo e Charlton Heston (1923-2018)

Tranquilamente, eu poderia fazer um artigo falando somente deste filme, pois, o fascínio que tal filme causa em mim, desde a infância, foi um dos responsáveis por eu amar cinema. Quanto ao filme, De Mille escalou um dos maiores elencos já reunidos para um filme. Charlton Heston interpreta Moisés, Yul Brynner interpreta Ramsés (na minha modesta e simplória opinião, sua melhor performance). Anne Baxter interpreta Nefretari, Edward G. Robinson interpreta o vilanesco Datã, Yvone De Carlo interpreta a esposa de Moisés, Séfora. Cedric Hardwicke interpreta Seth I. John Derek interpreta Josué, sucessor de Moisés na conquista da Terra Prometida, Nina Foch interpreta a mãe adotiva de Moisés, Bithiah e Marta Scott interpreta sua mãe, Yochabel. Também tem no elenco Vincent Price como Baka, mestre construtor do faraó, John Carradine como o irmão de Moisés, Arão e Debra Paget como Lilia, interesse amoroso de Josué. O filho de Charlton Heston interpreta o recém nascido Moisés. O filme foi um estrondoso sucesso, aliás, o maior sucesso comercial de 1956, tendo o dobro nas bilheterias do que o filme em segundo lugar, Volta ao mundo em 80 dias. Só para ter ideia, Os Dez Mandamentos lucrou expressivos $ 170,801,182 enquanto Volta ao mundo em 80 dias $ 84,000,000. A versão de 1956 tornou-se o maior sucesso da careira de De Mille e da história da Paramount. Os Dez Mandamentos de 1956 ganhou um Oscar, Melhor efeitos visuais para John P. Fulton, um dos grandes nomes do cinema desde a década de 30 tendo trabalhado em vários clássicos de terror da Universal. De Mille ainda produziu mais um filme, um remake de Corsário sem pátria, desta vez com Charlton Heston, Yul Brynner, Claire Bloom e Charles Boyer. Já com vários problemas de saúde, tendo inclusive, tendo um infarto durante as filmagens de Os Dez Mandamentos, em 21 de janeiro de 1959, De Mille deu seu último suspiro e partiu para sempre deixando para uma legião de fãs e cinéfilos do mundo todo, uma obra de valor imensurável.

Participação de De Mille em Crepúsculo dos deuses (1950)

Mauricio Rocha, 13 de junho de 2023.

Um comentário

  1. Assisti a grandes filmes do magnífico CECIL B. DE MILL, mas dois estão registrados por ter marcado a minha entrada na adolescência: Sansão e Dalila e Os Dez Mandamentos. A minha turma vibrava no cinema com a cena de Sansão lutando com o leão e cena de abertura do Mar Vermelho em Os Dez Mandamento. E ainda tem um detalhe, quando Os Dez Mandamento foi lançado aqui em Salvador, nos idos dos anos 1960, um carrão de som o anunciava chamando a atenção para a cena de abertura do Mar Vermelho como algo tão espetacular que “…levou 10 anos para ser concluída.” Era algo fantástico e a meninada queria e precisava ver!

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